Qual será o melhor investimento nos próximos 10 anos? Olhar para a rentabilidade dos diversos ativos na última década, e escolher *justamente* aquele que apresentou o melhor desempenho, é certeza de retornos garantidos para os anos vindouros? É o que vamos responder nesse texto…
O The Motley Fool é um dos sites de finanças pessoais mais descontraídos dos Estados Unidos. Com um amplo e variado repertório de artigos de boa qualidade, o site surpreende pelo alto nível de informações, e também pela boa organização geral de seu conteúdo.
Hoje, vamos abordar um assunto que é amplamente difundido no exterior, mas pouco discutido no Brasil (salvo algumas honrosas exceções), que é a alocação de ativos (asset allocation). E é oportuno trazer aqui o link do artigo do Motley, intitulado “uma breve história de um investidor estúpido”. Quando se trata de gerenciamento de carteira de investimentos, não se pode colocar todos os ovos numa cesta só, ou, o que é pior, apostar somente no ativo “mais quente” dos últimos anos, ou seja, daquele que rendeu mais. O texto do artigo do Motley, apesar de estar escrito em inglês, é curto e não é difícil de entender. Caso tenha dificuldades, você pode utilizar a ferramenta de tradução do Google, ferramenta essa que melhorou bastante de uns tempos pra cá (inclusive foi a matéria de capa da revista Veja de algumas semanas atrás), e sobre a qual fizemos um comentário no último sábado.
Robert Brokamp, o autor do artigo, fez uma pesquisa histórica abarcando os últimos 35 anos do mercado de investimentos local (1972 a 2007, ano em que o artigo foi publicado), abrangendo os principais ativos que podem compor a carteira de um investidor americano médio: ações blue chip/large caps, ações small caps, fundos de investimentos imobiliários (REITs, que captam a rentabilidade do setor imobiliário), fundos de ações estrangeiras, e commodities (ouro, petróleo etc.).
A situação é a seguinte: estamos no dia 1º de janeiro de 1980, e o investidor tem 10 mil dólares no bolso, querendo investir, para os dez anos seguintes. Qual ativo ele irá escolher, para segurar (buy and hold) até 1990? Olhando o retrospecto dos investimentos em diferentes classes de ativos nos últimos 8 anos, ou seja, do período que vai de 1972 até 1979, ele vê que as commodities renderam 22% a.a., obtendo a maior rentabilidade dentre os cinco ativos listados, durante os anos 70. Ele, então, resolve aplicar tudo em ativos tangíveis, ou seja, nas commodities.
Passada uma década, chegamos a 1990. E qual a constatação do nosso investidor? Que na década de 1980, as commodities, que na década anterior foram as campeãs de rentabilidade, tiveram o pior desempenho, rendendo apenas 10,7% a.a. Nos anos 80, quem brilhou foram as ações estrangeiras, com um retorno anualizado fabuloso de 22,8%.
Então, o nosso investidor resolve, em janeiro de 1990, aplicar em ações estrangeiras. Ele pensa consigo mesmo: “realmente, vejam só o que está ocorrendo, os japoneses estão comprando o Rockefeller Center”. Então, ele pega toda a grana e investe tudo em ações estrangeiras, esperando, com isso, multiplicar seu patrimônio durante os anos 90.
Passa-se uma década, e, no ano 2000, ele vê que as ações internacionais tiveram o segundo pior desempenho da década de 90, dentre as 5 classes de ativos passíveis de investimentos, só perdendo para a lanterninha das rentabilidades, as commodities (e isso explica, ao menos em parte, o porquê de a Petrobras e Vale terem se tornado as estrelas da Bolsa durante os últimos 10 anos, afinal, essas são empresas de commodities, que foram duramente castigadas durante os anos 90, sofrendo um brutal ciclo de desvalorização nesse período). Quem fez a festa, durante essa década – 1990 a 1999 – foram as large caps da Bolsa norte-americana, ou seja, as blue chips, com um retorno fantástico de 18,2% a.a.
E esse jovem investidor pensou o seguinte:
“- Ah, sim, Mas é claro que vou investir tudo na Bolsa. Afinal, o livro do Jeremy Siegel diz que as ações são o melhor investimento a longo prazo. E que alocação de ativos que nada! Esse papo de diversificar só serve para controlar riscos, não serve para aumentar retornos. É conversa pra boi dormir. Assim, como sou jovem e não tenho nada a perder, vou é concentrar tudo em ações”.
Diante disso, em janeiro de 2000, ele resolve aportar todo o seu capital investido em ações de grandes empresas norte-americanas, num índice amplo.
Bom, não precisa nem dizer qual foi o resultado, em Wall Street, durante os 10 anos que vão de janeiro de 2000 a janeiro de 2010… basta dizer que essa foi uma das piores décadas de todos os tempos para as ações dos EUA, não obstante elas tivessem obtido o melhor desempenho na década anterior.
O curioso é que o artigo só vai até 2006 – ele foi publicado em 14.08.2007 – e, na última tabela apresentada, adivinha quem foram as estrelas? Sim, os imóveis, representados pelos fundos imobiliários, com um retorno anualizado de impressionantes 22% a.a. Bom, todos sabemos que foi com a crise das hipotecas subprime que deu o start para a bolha estourar…
Só um detalhe adicional: nos anos 90, as ações norte-americanas retornaram 18,2% a.a. E, nos anos 00, renderam… bota outro zero aí. Renderam 0. O Dow Jones começou e terminou próximo dos 10 mil pontos (estou desconsiderando os efeitos da inflação, que puxaram o rendimento para baixo, e dos dividendos, que puxam para cima). Coincidentemente, o IBovespa rendeu, nos últimos dez anos, sabe quanto? 20% a.a. em dólares. Ou seja, o crescimento foi tão forte quanto o verificado nas Bolsas americanas na década imediatamente anterior. Para essa década, o crescimento do IBovespa será de_______________ (em 2020, voltaremos ao tópico e completaremos a lacuna :D).
Os efeitos de uma boa alocação de ativos
A conclusão do estudo é a parte mais interessante dessa breve história de um investidor estúpido: nesse ritmo de escolher o ativo “mais quente” da década anterior, os US$ 10 mil originais se transformaram em US$ 60.583. Nada mal.
Mas… e se ele tivesse repartido os 10 mil dólares iniciais em quantias iguais em cada um desses ativos – ações large caps, ações small caps, fundos de commodities, fundos imobiliários e, finalmente, ações estrangeiras – e fizesse o rebalanceamento do portfólio anualmente? Senhoras e senhores, pasmem: ele teria US$ 331.482. Ele teria mais do que quintuplicado seu patrimônio, em relação à estratégia anterior, de optar pelo melhor investimento da década passada.
A lição dessa história é muito simples: colocar toda a sua grana em apenas um tipo de investimento pode redundar em uma carteira significativamente menor. O que é “quente” numa década pode não sê-lo na posterior – aliás, quase sempre não é (nas últimas décadas, nunca foi). As palavras finais do artigo são muito boas:
“If you want to increase your wealth, if you want to protect your wealth, and if you want to parlay that wealth into a long retirement, an intelligently created and maintained asset allocation is the way to go”.
Numa tradução livre:
“Se você quiser aumentar sua riqueza, se você quiser proteger sua riqueza, e se você quiser aproveitar essa riqueza numa longa aposentadoria, uma alocação de ativos inteligentemente criada e administrada é o que há”.
Dessa forma, algumas dicas são sempre oportunas de serem dadas: não coloque todo seu patrimônio em Bolsa, mantenha uma permanente e boa reserva em renda fixa, ainda que você seja jovem, e, mesmo dentro da Bolsa, diversifique seus ativos. Além disso, saiba qual é a porcentagem que você possui, em seus investimentos, entre renda fixa e renda variável, fazendo os balanceamentos necessários quando ocorrer, num dado período de tempo, uma discrepância muito grande na proporção que você tiver estabelecido. Como diz Henrique Carvalho, em um artigo exemplar sobre alocação de ativos:
“O “segredo” da Alocação de Ativos está no rebalanceamento das classes. Ou seja, quando a porcentagem das classes se desviarem da sua porcentagem original devemos rebalancear nossa carteira, trazendo esta novamente para a alocação original.
Por exemplo: Tomemos uma carteira com 50% em Bolsa e 50% em Dólar. No final do 1º ano a Bolsa se valorizou 20% e o Dólar -10%. Neste caso devemos vender os excedentes em Bolsa para compor a parte que falta em Dólar. Deste modo estamos trazendo a carteira novamente para sua alocação inicial”.
Outro excelente artigo sobre gestão de carteira, com exemplos extraídos do mercado brasileiro, está no Informativo INI de julho de 2008.
Um exemplo prático e atualizado mensalmente sobre os efeitos benéficos reais de um portfólio bem diversificado, é o fornecido pelo Investimentos & Finanças. Também não percam os artigos que o Henrique Carvalho escreveu no seu blog HC Investimentos, na categoria de alocação de ativos. Uma discussão atualizada, com mais de 37 páginas de informação, sobre asset allocation se encontra no Fórum Investidor Agressivo. Um estudo histórico comparativo IBovespa vs. CDI entre 1995 e 2008, simulando carteiras hipotéticas com diferentes níveis de balanceamento, pode ser encontrado num ótimo artigo escrito pelo Maurício Carvalho para o InfoMoney. Finalmente, um estudo acadêmico intitulado “alocação de longo prazo: um estudo empírico com ativos brasileiros”, de José Geraldo Maciel Júnior, pode ser lido aqui.
Vale dizer que a alocação de ativos não é o remédio para todos os males. Nem todos os investidores a utilizam em sua carteira de investimentos. É apenas um dentre vários possíveis métodos de investimentos.
A diversificação – e não só a diversificação entre ativos diferentes, mas também a diversificação dentro de uma mesma classe de ativos (investimento em ações por meio de um fundo diversificado, como o PIBB, por exemplo) – é importante na medida em que minimiza as chances de uma grande perda. E o monitoramento ativo da carteira, com a tática dos rebalanceamentos, permite um melhor controle do risco.
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
Excelente texto Guilherme!
O assunto é muito importante e essa comparação entre retornos passados e projeções futuras traz boas reflexões. A principal delas seria a característica dos mercados de regredirem para sua tendência principal.
Normalmente quando algum investimento se desvia de sua tendência principal (ex. render 20% a.a quando historicamente rende 10% a.a), ele tende a reverter para novamente para ela.
Nesse exemplo poderíamos esperar que o tal investimento tivesse retornos próximos de 0% para voltar a tendência principal de 10% a.a.
O exemplo é simples mas seu conceito profundo.
No livro do Bernstein (The Intelligent Asset Allocator) ele faz uma comparação excelente, porém de um modo diferente do estudo retratado no artigo.
Ao invés de alocar 100% na classe que melhor performou, ele aloca no portfólio ótimo (aquele que teve maior retorno e menor risco) em um período de 5 anos e o projeta para os próximos 5 anos.
O resultado é impressionante. Vale a pena a leitura.
Parabéns por abordar um assunto que, na minha opinião, deveria ser conhecido por todo e qualquer investidor.
Grande Abraço!
Excelente artigo Hotmar. A alocação de ativos é essencial e a diversificação é a maior proteção que o investidor tem contra o futuro imprevisivel.
Viva a asset allocation!!!!!
Guilherme, Henrique!!!!
cade os fundos de índice em FIIS..rs..rs..
guilherme, parabéns pelo ótimo conteudo da matéria…
forte abraço
Luciano
Henrique, Investimentos e Luciano, obrigado!
O retorno às médias é, sem dúvida, um dos pilares sobre os quais se assenta a teoria da alocação de ativos. Aliás, estou lendo o livro do Bernstein atualmente, e traz estudos estatísticos muito interessantes e que convidam à reflexão.
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
Legal o artigo. Conheci o Motley Fool pelos artigos traduzidos da finada Página do SER-. Tem mto coisa legal lá.
Um abraço
Obrigado, Thiago!
De fato, o SER tinha uma página excelente sobre investimentos em geral.
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
Quanta informação interessante neste artigo Guilherme.
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Sempre ouvi falar deste Motley fool, mas nunca me interessei pelo mesmo. Você me recomenda assinar o feed?? O principal tema abordado por este site seria finanças pessoais??
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Abcs
Sim, Willy, o The Motley Fool aborda as finanças, com foco no mercado de ações individuais. Eu não assino o feed deles, mas tem muito material interessante por lá. É uma forma de diversificar seu conhecimento.
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
Guilherme,
Interessante esse post, todos bons investimentos, mas feitos nos momentos errados.
Fiquei pensando: será que alguém conseguiria chegar nessa situação?
De qualquer forma, melhor nunca colocar todos os ovos no mesmo cesto.
Abraços,
Oi Rosana, muitas pessoas acabam fazendo isso, comprando na alta e vendendo na baixa, quando deveria ser o contrário.
Nesse momento de Bolsa em baixa e dólar em alta, aposto que há muita gente comprando dólar e vendendo Bolsa, quando deveria ser o contrário.
Para minimizar riscos, o caminho, o melhor caminho, é sempre adotar uma estratégia inteligente de alocação de ativos.
Abç!
Agradeço por sua resposta, agora ficou mais claro para mim. 🙂
Legal! 😀