Uma das maiores dificuldades do ser humano é controlar as compras por impulso. Hoje, com a facilidade de se comprar qualquer coisa até sem dinheiro algum – bastando, por exemplo, usar um cartão de crédito com vencimento depois da data do recebimento do salário – e com a nossa exposição cada vez maior a vitrines e propagandas de consumo muito bem elaboradas, é muito difícil dizer “não, obrigado“, e tocar a vida pra frente.
O texto de hoje aborda não apenas uma dica para economizar dinheiro, mas sim uma dica que pode funcionar também para gastar dinheiro, mas gastá-lo melhor, se esse for o caso.
Trata-se do uso diário da regra dos 30 dias. Como funciona isso na prática?
Simples: viu, pensou, ou imaginou, alguma coisa que te interessa? Não faça a compra de imediato. Não faça. Espere. Dê tempo ao tempo. Mais precisamente, 30 dias.
Durante esse intervalo de tempo, você irá refletir, indagar, pesquisar, e se questionar se realmente precisará comprar tal coisa.
Mais: esse tempo servirá também para você analisar alternativas de consumo: será que não existe um item equivalente mais barato? Uma alternativa mais funcional? Uma opção economicamente mais viável, com um custo/benefício mais atraente?
Além disso, esse tempo terá ainda a utilidade de fazer você verificar se vale mais a pena esperar mais um pouco para realizar o ato de consumo. Indague-se: sua qualidade de vida piorou por você não ter tido tal coisa durante esse intervalo de 30 dias? A ausência da compra efetivamente fez falta? Ou dá pra esperar mais um pouco mais? Ou mesmo viver sem?
Separando “desejos” de “necessidades”
A regra dos 30 dias é ótima principalmente para separar “desejos” de “necessidades” de consumo.
Isso ocorre principalmente quando a ideia da compra de um produto não surge em função da percepção da ausência de alguma coisa, mas sim em função da sugestão de alguém, ou de algum material que você leu, ouviu ou assistiu, na Internet, na mídia ou nas ruas.
Imagine, por exemplo, que você tenha ouvido falar de um restaurante badalado nas conversas com seus amigos. Detalhe: esse restaurante é caro, e incompatível com sua atual média de gastos com restaurantes.
Procurando mais informações na Internet sobre o tal restaurante, você descobre que ele está entre os 10 mais bem classificados no TripAdvisor, o que aumenta a vontade de ir lá e confirmar todas as impressões positivas que você viu, ouviu e leu a respeito dele, embora o preço cobrado esteja bem acima de suas possibilidades financeiras.
Se você não tiver controle financeiro algum, a vontade imediata de usufruir do restaurante irá se sobrepor a qualquer tipo de planejamento que se faça, e você tratará de ir até lá no próximo final de semana disponível, mesmo que nesse mês você já tenha atingido o limite de gastos com refeições fora de casa.
A solução?
Espere 30 dias.
Tenha paciência e veja se realmente essa é uma coisa que você de fato precisa.
Com o passar dos dias, e com o decorrer das semanas, você irá avaliar melhor se de fato irá querer conhecer esse restaurante, ou se é mais viável – e tão prazeroso quanto – escolher outros restaurantes menos caros, mas igualmente bem avaliados pelos frequentadores.
Um dos méritos da regra dos 30 dias é justamente esse: evitar que você gaste dinheiro em demasia com coisas que você poderia muito bem dispensar, ou seja, viver sem.
Ao se conceder o privilégio de parar e pensar um pouco a respeito da compra, você terá condições de analisar com mais acuidade cerebral sobre todos os prós e contras de cada ato de consumo que passou pela sua cabeça num dado instante.
Em outras palavras: você racionaliza suas compras, conferindo-lhes um caráter mais programático, e menos impulsivo.
Mas não é só isso.
Escrevendo no papel: as verdadeiras prioridades se leem com “os olhos”
Para que a regra dos 30 dias atinja o ápice de sua eficiência, no planejamento financeiro pessoal, eu considero indispensável que você escreva no papel a sua meta de compras, com a maior quantidade possível de detalhes: a descrição completa do item, o seu preço, e o local (físico ou virtual) da compra. Isso pode ser feito também, é claro, no computador, ou ainda no smartphone.
E por quê escrever no papel?
Simples: porque aquilo que se vê “com os olhos”, e não apenas com a mente, aumenta a qualidade de suas decisões sobre as compras, uma vez que te leva a reflexões mais profundas e duradouras sobre a real necessidade das aquisições.
Isso, aliado ao poderoso fator “tempo” que você acrescenta à sua decisão – os inevitáveis 30 dias – fará com que a decisão de comprar – ou não comprar – seja mais robusta, mais refinada e mais inteligente.
Além disso, a decisão sobre a compra fica muito mais equilibrada, já que a ideia de comprar algo provavelmente partiu de um ato corporificado num instrumento material: num pedaço de papel de uma revista, num site da Internet, num outdoor de rua, ou numa vitrine de loja.
Logo, se você mantiver a ideia de comprar ou não comprar alguma coisa apenas na sua mente, a tendência é que você seja compelido a gastar dinheiro, já que isso – o ato de comprar – é uma forma mais fácil de “se livrar” dessa coisa que fica povoando – e incomodando – a sua mente.
Ao tirar a ideia da cabeça, e colocá-la no papel, você dará um alívio à sua psique, transferindo para um material externo todo o complexo de prós e contras que envolvem a compra do bem. Isso fará com que o seu cérebro trabalhe melhor também, lhe dando opções que antes, devido ao entupimento de sua psique, não tinham espaço para serem trabalhados em suas reflexões diárias.
A utilização prática da regra dos 30 dias
Eu gosto e utilizo bastante essa regra dos 30 dias.
Quando eu pretendo comprar alguma coisa, digamos, um livro novo, eu anoto, no smartphone ou no Excel, os detalhes relativos a tal item de consumo, e, a partir daí, quase que diariamente, e sempre semanalmente, eu reviso essa lista.
Às vezes, o item é descartado poucos dias ou poucas semanas depois: isso demonstra que tal coisa era um desejo apenas momentâneo, fruto do pensamento ocorrido naquele dia específico, dentro daquelas específicas circunstâncias, que não teria serventia a médio e longo prazos.
Contudo, em outras tantas vezes, o item de consumo permanece lá. Decorridos os 30 dias, se ele ainda permanecer na lista, isso é um forte sinal de que ele passou da categoria dos “desejos” para uma real “necessidade”, o que já nos faz partir para as etapas subsequentes, de pesquisa e compra.
Nem sempre, por outro lado, se pode esperar os 30 dias para analisar se um produto é necessário ou não, dados os contextos fáticos que envolvem a aquisição. Por exemplo, no caso de um produto que quebrou ou não tem conserto, é evidente que a compra de outro se põe como uma necessidade até urgente, a depender do grau de sua indispensabilidade para a vida da pessoa.
Porém, para outras situações, a regra dos 30 dias pode funcionar bastante, principalmente naqueles casos em que você está na séria dúvida entre comprar ou não comprar, e o tempo de resposta pode esperar 30 dias ou mais.
Conclusão
Nossa vida financeira é resultado de nossos hábitos, e nossos hábitos, por sua vez, são o fruto daquilo que fazemos repetidamente, no decorrer de dias, semanas, meses e anos.
Só quem tem um orçamento doméstico controlado sabe o trabalho que dá evitar os gastos por impulso. Para evitar gastar dinheiro de forma contraproducente, é essencial adotar algumas técnicas simples de gestão financeira pessoal, e a regra dos 30 dias é uma dessas técnicas.
Ela definitivamente não custa nada: está aí, de graça. Basta papel e caneta, um aplicativo de smartphone de gerenciamento de listas ou tarefas, ou a boa e velha planilha de Excel.
Ela requer a criação e a incorporação de um hábito: que você, ao pensar em comprar alguma coisa que implique um desembolso considerável de dinheiro, anote no papel essa compra, e mais, que reflita sobre ela, preferencialmente todos os dias, e no mínimo semanalmente.
Ao realizar esse trabalho de análise crítica, você não estará apenas definindo se vale a pena ou não gastar dinheiro com ela, mas você estará, acima de tudo, moldando suas próprias prioridades no uso consciente do dinheiro, demarcando quais itens de consumo merecem sua atenção, por adicionarem algum tipo de valor para sua vida.
E, ao fazer isso, você estará aprimorando seu planejamento financeiro, pois se sentirá mais motivado a poupar e a investir dinheiro, já que suas metas financeiras estarão, a partir de então, genuinamente vinculadas a objetivos não financeiros.
Experimente a regra dos 30 dias. Seu uso é simples, mas poderá dar aquele impulso que faltava para você controlar melhor o uso do dinheiro. 😉
Excelente dica. Nunca havia verbalizado a ideia, mas sigo algo parecido, especialmente com meus gastos maiores.
Além da exceção exemplificada no texto (a respeito de um objeto que tenha quebrado), vejo mais uma exceção em potencial, mas um pouco menos “preto no branco”: quando você vê uma excelente promoção, se acompanha por exemplo no fórum da HardMOB ou no Gatry, e o problema é que raramente o valor promocional permanecerá aquele por 30 dias.
Claro, existe um forte risco de que você compre algo por impulso nesse caso, e pior ainda, às vezes nem é uma promoção tão boa, mas você pensa que, meramente por estar em um desses sites, deve ser uma boa promoção, vai lá e compra. No outro extremo, às vezes você quer algo, mas não está disposto a pagar o preço normal, e fica monitorando promoções até chegar num preço que você julga bom.
Tenho um exemplo que seria um meio termo, mas mesmo assim acredito que fiz uma boa compra: sei que preciso dar presentes de natal para as pessoas mais próximas, e acabo sempre ficando em dúvida do que dar. Periodicamente acesso um site de promoções, e desta vez vi uma batedeira planetária no valor de R$ 158. Tenho um modelo parecido (até menos moderno do que a batedeira em questão), e sei que o valor dela era cerca de R$ 500 há 6 anos atrás, pois coloquei esse produto na minha lista de casamento na época. Então, sabia que o produto estava num preço excelente, e sabia que seria útil para a pessoa que pensei em dar o produto. Superficialmente, o que eu fiz parece uma compra por impulso; porém, vejo que na verdade fiz uma excelente compra e tenho certeza que não vou me arrepender.
Outro exemplo similar seria na compra de passagens aéreas em promoção, ou quando temos boas promoções de vendas de milhas.
Talvez uma boa forma de reconciliar este conflito (tempo para pensar vs. tempo de validade da promoção é a seguinte), e vou ilustrar com o exemplo das passagens aéreas. Primeiro, decida que você quer mesmo viajar. Decida uma época, a duração aproximada da viagem, os destinos possíveis, etc. Consulte no seu local de trabalho se poderá tirar férias nessa época, e por um prazo consistente com a duração da viagem. Faça um orçamento aproximado de gastos da viagem e veja se você terá como bancá-la. Inclusive, pesquise valores que já foram ofertados para viagens nos trechos escolhidos, no período escolhido, para ter noção do que é uma boa promoção e o que não é. Enfim, só de ter toda esta trabalheira, você se certifica se quer mesmo viajar ou não — se não estiver com tanta vontade assim, não vai encarar esse trabalho todo. A partir desse momento, quando você se deparar com uma boa promoção, poderá comprá-la na hora (até porque se demorar pode perder a promoção), sem medo de errar ou de estar fazendo uma compra por impulso. Veja que isso mais ou menos se encaixa no exemplo que dei acima: sabia que queria comprar um presente para o natal, tenho noção dos valores que posso gastar, conhecia o valor do produto que comprei, então quando surgiu uma promoção, não hesitei em comprar.
Perfeitos os seus exemplos, Swine! No cerne de tudo, está a questão do planejamento, como fator decisivo para avaliar boas e más escolhas de consumo.
Com compras conscientes e deliberadamente planejadas, tudo fica mais fácil!
Abraços!
MUITO LEGAL. Eu não anoto nada, afinal eu não sou impulsivo e até meio pão duro. Mas para a maioria das pessoas isso é bem legal. Mas também existem pessoas que nunca se darão a esse “trabalho”. São pessoas que não querem pensar racionalmente por preguiça. Isso é uma pena…
Obrigado, SB! De fato, para muitas pessoas, o ato de comprar é sempre motivado por fatores emocionais, e, para esse segmento de pessoas, a dificuldade de controlar o orçamento acaba virando um vício.
Abraços!
Ahhh… estou precisando colocar em prática esta tática dos 30 dias! Um dia destes estava pensando em prometer a mim mesma não comprar roupas (para mim) no ano que vem. Sou uma viciada em roupas e sim, compro-as por impulso, por achar bonita, por um desejo (não é necessidade! meu guarda roupas está cheio, mal posso mexer nos cabides). Valeu pelas dicas, Guilherme. Vou passar a anotar em um papel e esperar os 30 dias.
Falando em compras de natal… tenho muita vontade de comprar agora em outubro, pois sei que em dezembro está tudo muito mais caro. No entanto, não me sinto segura nem confortável de faze-lo agora porque se a pessoa não gostar e quiser trocar, não poderá troca-lo. Tem alguma dica quanto a essa questão de compras de fim de ano, Guilherme?
Oi Isabela!
De fato, controlar os impulsos de consumo é difícil, e requer bastante atenção e força de vontade.
Quanto às compras de Natal antecipadas, uma solução possível é fazer um mapeamento dos interesses, gostos e necessidades das pessoas para quem você pretende presentear, optando por soluções as mais neutras possíveis, a fim de minimizar as chances de cair numa margem de erro.
Desse modo, as compras saem mais baratas, e a taxa de acerto fica maior. 😉
Vou ser a chata: porque no ano que vem? Pque não a partir de hoje? 🙂
Realmente… bem pensado…. 🙂
Gostei da dica dos 30 dias.
Tentarei adotar.
Obrigado!!
Valeu, Marcos!
Fala Guilherme!
Pois é, essa tática é infalível! Você abordou mais o assunto interno da escolha, se de fato precisamos daquilo que queremos. Se de fato, precisamos, ela também pode ser útil na parte prática da ação também. Se o que queremos está acessível na Internet, podemos dar uma segurada e cadastrar um preço máximo de nosso produto desejado em sites como Buscapé ou Zoom. Garanto que em menos de 30 dias vc receberá um alerta por email dizendo que o preço caiu.
Sobre listas de compras: nosso costume aqui é manter uma nota do Keep compartilhada entre mim e a esposa. Sempre que vemos que algo está acabando em casa, escrevemos na nota. Uma vez no supermercado, focamos apenas na lista. Muito difícil comprar algo além. Pois o que não está na lista é, provavelmente, desnecessário a curto prazo.
No fundo é, tudo, como você finaliza: uma questão de hábitos.
Abraço e boa semana!
Ótima dica, André, essa das listas facilita a organizar o nosso lado “racional” para as compras.
E gostei das dicas dos alertas de compras também!
Abraços!
A regra dos 30 dias é ótima para diminuir as compras por impulso, e assim sobrar mais dinheiro no final do mês, para investir
Abraço e bons investimentos
Sem dúvida, DIL, tudo é uma questão de causa e consequência, o que afeta a parte do orçamento tem implicações diretas para a parte dos investimentos.
Guilheme,
Gostei dessa técnica, eu ainda não conhecia.
Como disse Schopenhauer. “A vida é uma constante oscilação entre a ânsia de ter e o tédio de possuir.”
Por isso é muito importante termos consciência de que a compra pretendida é realmente necessária ou se é apenas mais um desejo que daqui a alguns dias (ou meses) estará em nossa enorme caixa de desejos atendidos, mas não aproveitados em sua plenitude, pois outros novos desejos já estão na fila aguardando para serem satisfeitos, formando um círculo vicioso praticamente perene.
Estou com um post “no forno” sobre esse assunto. Pretendo publicá-lo no início de dezembro, por ser uma época na qual o consumo dá um enorme e muitas vezes injustificável salto.
Boa semana!
Oi Rosana, gostei bastante dessa frase do Schopenhauer.
É verdade, os desejos humanos são ilimitados, o grande desafio dos dias atuais é gerenciá-los em face de nossos escassos e limitados recursos materiais.
No aguardo do seu post, que certamente virá num “timing” perfeito.
Abraços!
Olá Guilherme.
Estou ficando bom em adiar o consumo que não é essencial, ainda não sou muito bom com compra planejadas, realmente nunca pensei passar isso para o papel, preciso trabalhar muito esse meu lado financeiro.
Sucesso
Oi Sócrates, vale a pena experimentar o método, para ver se ele adiciona valor ao seu orçamento doméstico.
Abraços!
Excelente texto Guilherme.
Na prática já faço isso, além de também programar alguns alertas.
Nessa brincadeira, economizei mais de R$100 na compra do Kindle e deixei de comprar tantas outras coisas, utilizando mais as coisas que já possuo.
Sucesso,
Abc
Excelentes exemplos, FPI!
Um efeito colateral importante disso tudo é o fato de passarmos a valorizar mais aquilo que já temos.
Abraços!
Muito muito bom.
Eu uso a regra do “sem menos não imediatamente”. Ou seja, se eu desejar algo e quiser comprar na hora, eu deixo pra comprar no outro dia, ou pelo menos na próxima vez que for ao local. Só esse lapso de horas, e dias, às vezes só de sair da frente do item desejado, já inibe o impulso da compra em mais de 80%. Venho economizando muito assim. Agora tem coisas que não é suficiente esse período curto, especialmente quando o desejo é grande. Seguir essa regra dos 30 dias é importantíssima. É um remédio contra a impulsão. E só o fato de te levar a tomar registro daquilo já é um verdadeiro antídoto contra o veneno do consumismo.
Um abraço e fica com Deus.
Oi DP, gostei da sua técnica ““sem menos não imediatamente”.
No começo, tudo é bastante difícil, mas depois nos acostumamos, e passamos a adotar essa regra quase que instintivamente.
Abraços!
Fala Guilherme. Beleza?
Você já me ajudou bastante com seus excelentes textos.
Inclusive, este é o único portal sobre finanças que me recordo e visito quando quero saber alguma novidade.
Pois bem, com a queda da selic você fez algum texto sobre possíveis alternativas aos CDBs e lci da vida? Seria legal. Pois pelas minhas contas, na melhor das hipóteses esses investimentos rendem hoje no máximo 0.6% ao mês…
Forte abraço e obrigado mais uma vez por tudo que aprendi aqui! Valeu!
Olá, Carlos, muito obrigado pelas palavras!
Gostei muito da sua sugestão de pauta, já anotei! Certamente esse é um tema de interesse de muitos leitores do blog!
Abraços!!!