Lidar com as finanças pessoais e gerenciar o orçamento doméstico envolve muitas vezes controlar mais as emoções do que propriamente realizar um exercício puramente intelectual e racional.
Isso porque o gasto de dinheiro cruza as fronteiras da realização de sonhos e de desejos, os quais, se não forem devidamente planificados, racionalizados e domados, podem resultar em severas perdas de dinheiro e, consequentemente, de patrimônio.
Vamos a um exemplo muito simples: João e Maria, dois jovens na idade dos vinte e poucos anos, resolvem se casar. Em meio à euforia e à emoção com o casamento, resolvem também que querem comprar um imóvel, afinal, “quem casa quer casa”, não é mesmo?
Não mesmo! Será que realmente apressar a compra da casa própria é a melhor opção? Há diversos fatores que jogam contra essa decisão: além do fato de, justamente por serem jovens e estarem no início de sua vida profissional, e, portanto, provavelmente terem que financiar a compra do imóvel, pesa também contra a possibilidade de mudança de cidade, em virtude de mudança no emprego.
Logo, a melhor solução para esse casal é alugar um imóvel, juntar dinheiro e, lá na frente, quando as coisas estiverem mais estabilizadas, aí sim comprar uma casa.
Trocando em miúdos: se não houve o cultivo da necessária paciência, as chances de perder dinheiro são muito grandes.
Gratificação atrasada vs. Gratificação instantânea
Em tema de consumo, paciência tem tudo a ver com planejamento, e planejamento tem tudo a ver com estudo e o domínio das emoções.
Em princípio, não há nada de errado em comprar um carro: o problema é querer comprar um carro muito caro e acima de suas possibilidades e, além disso, comprar um carro sem dinheiro – ou seja, um carro financiado.
Se o seu objetivo for comprar um carro, que isso seja feito com um prévio planejamento financeiro: primeiro “adquirindo” o dinheiro, e depois, com o dinheiro em mãos, trocando esse dinheiro pelo carro.
Quando você compra um carro mediante financiamento, na verdade você está comprando duas coisas: está comprando o carro, e está comprando uma dívida.
O mesmo raciocínio vale para a compra de todos os demais bens materiais em geral: adie a gratificação pelo ato de comprar.
A falta de paciência custa caro, e o preço da pressa vem na forma não só de juros, prestações mensais, boletos e códigos de barras que não param de chegar no seu email, no seu celular, ou em sua casa, mas também na forma de pressão financeira que se descarrega sobre sua mente quando há uma infindável quantidade de compras parceladas em seu cartão de crédito, fruto do hábito de sempre querer as coisas aqui e agora.
A paciência nos investimentos
“O cultivo da paciência como forma de evitar perder muito dinheiro” é uma frase que não se aplica apenas na compra de passivos (casa, carro, viagens etc.), como poderia parecer à primeira vista. Ela também tem inteira aplicação quando se trata de compra de ativos, ou seja, de investimentos.
Na verdade, eu diria que a paciência é até mais importante no lado dos investimentos, pois a construção e consolidação de patrimônio através da arte de investir depende essencialmente do trinômio aportes + tempo + juros compostos. Você não pode querer investir hoje com a pretensão de multiplicar por 10 seu capital em menos de 6 meses. Tampouco desejar sair de uma ação logo na primeira queda.
Todo mundo que investe em ações tem uma história de arrependimento para contar, que vendeu muito cedo uma posição em ações, e a ação decolou justo logo em seguida.
Pipocam na Internet casos de pessoas que compraram ações da Magazine Luiza (ainda a ação mais comentada nos dias atuais) lá em 2016 e 2017, mas que venderam logo em seguida.
Raríssimos são os casos de pessoas que conseguiram segurar (“hold”, buy and hold) determinadas ações, fundos de investimentos e outros ativos, por lapso de tempo suficiente para fazerem elas frutificarem e darem o retorno esperado.
Quando acontecem, tais casos reais merecem ser celebrados e devidamente destacados, pois constituem um forte incentivo para que os demais investidores possam fazer a mesma coisa: cultivar a paciência.
É o caso, por exemplo, do leitor Lucas, que contou seus aprendizados em 20 anos investindo no mercado financeiro (post aqui).
Tá, mas aí alguém poderia dizer: se eu tivesse cultivado a paciência no caso de compra das ações da OGX, eu teria perdido todo o capital…
Para esse tipo de afirmação, eu repito a frase que disse acima: em tema de consumo investimentos, paciência tem tudo a ver com planejamento, e planejamento tem tudo a ver com estudo e o domínio das emoções.
É através do estudo que se consegue selecionar bons ativos, alocá-los em percentuais adequados ao seu apetite ao risco, e que façam a carteira ter a rentabilidade necessária para alcançar seus objetivos de vida.
Se sua carteira estiver bem diversificada, se o risco for devidamente mensurado e controlado, o que você tem que fazer é dar tempo ao tempo, e ver o transcurso do horizonte temporal correr a seu favor.
Conclusão

“Devagar e sempre” poderia ser o subtítulo desse artigo. Quem tem pressa, além de obviamente poder ter que pagar caro pela pressa (na forma de criação de dívidas, pagamento de juros abusivos etc.), ainda pode amargar evidentes prejuízos, principalmente no campo dos investimentos, se as emoções não forem devidamente controladas.
Vivemos imersos naquilo que eu poderia chamar de era da ansiedade: as pessoas não têm paciência pra mais nada. Se uma pessoa me envia um email de manhã, já quer que eu responda naquela mesma manhã – e ainda me envia um email à tarde perguntando o motivo de eu ainda não ter respondido aquele email naquela manhã.
Se alguém te envia uma mensagem de WhatsApp e você lê, aparecendo no celular dela aqueles dois sinais de VV com cor azul, prepare-se para um interrogatório caso você apenas leia, mas não responda.
Ao perderem a paciência em questões relacionadas às finanças – o que é muito fácil hoje em dia, dada a fartura cada vez maior de crédito e da possibilidade de comprar praticamente qualquer coisa sem ter a disponibilidade do dinheiro no ato da compra – as pessoas se expõem a um risco desmesuradamente assustador de perderem as rédeas de sua vida financeira, se atolarem em dívidas e adicionarem ainda mais camadas de preocupação e estresse às suas já tão atribuladas vidas.
Portanto, a recomendação que fica do texto de hoje é: exercite seus músculos mentais da paciência. Programe-se. Planeje. Evite seguir a manda. Resista à tentação de fazer o que tudo mundo está fazendo.
Em vez disso, poupe. Conserve. Multiplique. Aja com discrição, como se estivesse atuando nos bastidores. A vida não se restringe a um palco onde você precisa ganhar curtidas, likes ou joinhas pelas coisas que compra ou ficar se exibindo aos quatro cantos mostrando quanto rendeu sua carteira.
A paciência, exercitada em conjunto com virtudes como a temperança, a resiliência, a prudência, a disciplina, e a persistência, colherá seus bons frutos, mais cedo ou mais tarde.
Como diz Tony Robbins, quando fala de disciplina (mas que tem tudo a ver com a paciência): “existem duas dores na vida, a dor da disciplina [e da paciência, acrescentaria eu], e a dor do arrependimento”. Cabe a você escolher que tipo de dor está disposto a sofrer. 😉
Perfeito, Guilherme!
Psicologia comportamental é essencial para termos sucesso na vida, seja financeiro como em nas demais áreas. Muitas pessoas preocupam-se muito com a tecnicidade mas esquecem que é o COMO a usarão que fará a diferença.
A emoção pode ser essencial e muito bem vinda em muitas áreas da vida, mas no campo financeiro, é algo corrosivo rsrs.
Tem uma coleção que adquiri no passado com bons (e simples) livros que falam muito sobre a psicologia comportamental – a Expomoney. Foram eles que me auxiliaram a desenvolver esse lado. Se alguém tiver acesso a sebos, é bem provável que encontre alguns dos títulos a preços bem camaradas.
Abraço!
Olá, VL, ótimas dicas!
Realmente, as emoções na área financeira podem mais complicar do que ajudar.
E a coleção da Expomoney sobre psicologia comportamental é ótima, pois ajuda a entender melhor todo o processo decisório.
Abraços!
Esse ano tenho aprendido muita coisa sobre ter paciência com o dinheiro, exatamente nesse mês tomei uma difícil decisão…deixei de comprar o carro que tanto desejava e aportei o valor dele em ativos financeiros. Observei que não tenho patrimônio que condiz com o que eu queria, ou seja, não é hora rsrs
https://semeadorfinanceiro.wordpress.com/2019/09/12/semeadura-do-dia-12-09-12-12185-aportei-o-carro-que-desejava/
De bônus, agora ao invés de pagar por manutenções mais caras, IPVA e seguro…Irei receber dividendos de Fundos Imobiliários. A mágica de saber distinguir Ativo x Passivo, bem como dar um passinho para fora da corrida dos ratos!
Abraço
Parabens!!!! Excelente
Otimo texto
Eu estou bem preocupada com.o futuro. Começando aos poucos. Gostaria de reduzir gastos com carros e impostos. Mas ta bem dificil.
Todos esses textos e comentarios mos ajudam muito! Obrigada
Ótimo, Maria, continue assim!
O mais importante é você continuar cultivando esses valores como persistência e foco. Os resultados virão.
Abraços!
Excelente iniciativa, SF, parabéns!
Poucos têm a coragem de fazer o que você fez.
E certamente o cultivo dessa mentalidade vencedora fará toda a diferença no longo prazo.
Abraços!
A prática de só gastar o dinheiro que já se tem, isto é, de poupar antes e consumir depois, é talvez o principio mais importante das finanças, a meu ver.
Concordo, Vânia!
Guilherme,
“O mesmo raciocínio vale para a compra de todos os demais bens materiais em geral: adie a gratificação pelo ato de comprar.”
E muitas vezes quando adiamos, não é raro percebermos que nem queríamos tanto assim o produto. Ao agir assim por mais vezes, a reflexão antes da compra acaba se tornando um hábito, o que resulta em menos compras desnecessárias.
Um bom final de semana!
Verdade, Rosana! E isso não deixa de ser um ótimo exercício para treinar as virtudes da paciência e de uma vida mais simples.
Bom final de semana também!
Excelentes ponderações.
A paciência realmente é um dos pilares de uma vida financeira de sucesso. Como você pontuou a prática da paciência é importante tanto na ponta dos gastos quanto nos investimentos.
Já vi muitos amigos tomando decisões erradas por falta dela, seja financiando um apartamento logo no início da vida adulta, porque é o esperado socialmente falando aqui no Brasil, ou não conseguindo poupar por causa da percepção de que os investimentos rendem pouco a cada mês, então é “muito melhor aproveitar a vida hoje gastando”.
Ainda sobre a importância da paciência nos investimentos, como diria Warren Buffet:
“The stock market is designed to transfer money from the active to the patient.”
Excelentes comentários, Financionauta!
Gostei bastante da sua argumentação no tocante às “expectativas sociais”: as pessoas muitas vezes agem e gastam dinheiro mais por pressões externas do que por vontade própria. Não há análise financeira racional no uso do dinheiro.
Abraços!