Se as finanças pessoais pudessem ser enquadradas como uma disciplina acadêmica, eu diria que o melhor aprendizado não ocorreria dentro da sala de aula, ouvindo teorias econômicas ou fazendo exercícios de memorização para tirar uma nota suficiente para a aprovação.
O melhor aprendizado, na verdade, ocorreria fora da sala de aula, no mundo real, no dia a dia do cotidiano, afinal de contas, aprender sobre finanças pessoais é essencialmente criar hábitos sustentáveis para controlar o dinheiro, fazê-lo um meio para conquistar metas não financeiras de curto, médio e longo prazos e, assim, ter tranquilidade financeira, não só no presente, mas também no futuro.
O processo de aprendizado e aquisição de educação financeira, portanto, será tanto mais proveitoso e útil quanto mais você se engajar pessoalmente nesse processo.
E por “se engajar pessoalmente” eu quero dizer: agir para ser um exemplo. Construir hábitos para ser uma referência. Agir de tal modo que as pessoas ao seu redor queira te imitar.
Pois, se você adquirir os hábitos e os comportamentos de uma pessoa educada financeiramente, você estará não só aprendendo melhor, mas também transmitindo essas valiosas lições para pessoas do meio em que você se insere, sem necessariamente falar, explicar ou dizer, mas simplesmente… agindo. Sendo um exemplo.
Suponhamos que você esteja endividado e queira liquidar todas as dívidas oriundas de financiamento de carro, financiamento imobiliário, e rotativo de cartão de crédito.
Não basta, por óbvio, ler livros, posts de blogs, e vídeos do YouTube sobre como sair das dívidas, listando-as, organizando-as, e “matando-as” segundo uma ordem decrescente de volume ou taxa de juros.
É preciso efetivamente agir, de forma metódica, disciplinada e constante, mas… agir, de qualquer forma. Agir para mudar o estado de coisas.
Da mesma forma, se o seu orçamento doméstico está bagunçado, se você não sabe quanto ganha, se você não sabe o percentual de seus gastos que é destinado para gastos com restaurantes e comida fora de casa (aliás, você sabe quanto é? 5%? 3%? 1%?), está na hora de dar um basta nessa bagunça toda e organizar sua vida financeira, compilando todos os dados financeiros de gastos, de maneira metódica e disciplinada, a fim de ter uma noção precisa e exata sobre para onde está indo seu dinheiro, quais categorias de gastos mais consomem seu orçamento doméstico, e, assim, estabelecer parâmetros de gastos que caibam em seu orçamento, e reflitam melhor suas prioridades, seus valores e suas necessidades.
Se você está com 37 anos de idade e ainda não se deu conta de que a aposentadoria já pode ser avistada na linha do horizonte (post aqui), você está esperando o quê? Está esperando que a Reforma da Previdência aumente seus direitos? Vai ficar sentado esperando que a solução para a sua aposentadoria financeira parta dos outros, e não de você mesmo?
Não se iluda. Não se acomode. E não espere por soluções milagrosas vindas de outras pessoas, instituições ou empresas. Uma das melhores formas de você aprender finanças pessoais, aprender sobre investimentos, aprender sobre aposentadoria, aprender sobre controle do orçamento doméstico, consiste precisamente em ser um exemplo. Nem que seja só para você mesmo.
A construção de uma nova identidade
Quando você decide dar uma guinada em sua vida financeira, a partir do momento em que você decide parar de gastar com tantas coisas desnecessárias (que é o que a nossa sociedade quer, não se iluda a respeito disso), e passa a priorizar objetivos que mais tenham a ver com você (por exemplo, poupar para a aposentadoria) do que com os outros (por exemplo, a “necessidade” de impressionar estranhos em redes sociais e na vida off line), você passa por um interessante processo de construção de uma nova identidade.
É interessante parar e refletir um pouco sobre isso, pois as pessoas ao seu redor acharão no mínimo estranho que o Fulano tão gastador e tão esbanjador com viagens, bens materiais e carros cada vez mais caros na garagem, passe a ter uma vida mais regrada financeiramente, consumindo menos e, por consequência, ostentando menos. “Seria isso indício de problemas financeiros?” Pensariam alguns.
Vale a pena falar sobre isso porque, quando as pessoas começam a perceber que você, em vez de trocar de carro a cada 2 anos, passa a trocar de carro a cada 5 anos (ou mais), elas acham que você está com algum problema financeiro, quando na verdade é o exato oposto que acaba ocorrendo!
Ou seja, que você está na verdade acumulando mais patrimônio financeiro, ao deixar de girar patrimônio com passivos tão caros (como carros) em intervalos tão curtos de tempo.
Navegar no mar das finanças pessoais é na verdade navegar contra a maré, navegar contra o senso comum, como eu tenho dito ao longo dessa década de existência do blog Valores Reais. É ter atitudes contraintuitivas, pois são essas atitudes contraintuitivas que farão você acumular patrimônio de verdade, tais como:
- Aumentar o ciclo de vida útil de seus aparelhos eletrônicos: por exemplo, só trocar de celular quando ele efetivamente não funcionar mais;
- Morar num imóvel que esteja abaixo de suas possibilidades: o livro Milionário Mora ao Lado demonstra bem essa realidade, ao narrar que os verdadeiros milionários norte-americanos moram em casas mais modestas e têm vidas frugais;
- Espaçar na maior medida possível o intervalo de troca de seu carro, resistindo à tentação de trocá-lo a cada ano ou a cada dois anos;
- Praticar a frugalidade, já que, como bem disse Thomas Stanley no livro acima mencionado, os milionários querem ser reconhecidos pelas realizações pessoais e profissionais alcançadas no curso de suas vidas, e não pelos objetos de valor que possuem.
Ser exemplo é uma via de mão dupla
A construção dessa nova identidade nas finanças pessoais, ou pelo menos a aquisição de novos hábitos financeiros, não tem apenas o poder de, obviamente, melhorar seu padrão financeiro em termos estritamente pessoais e familiares.
Isso porque ser um exemplo em matéria de finanças pessoais também lhe dá o inegável poder de ser uma influência positiva na vida de outras pessoas, motivando-as e incentivando-as a agirem como você, de modo que também elas possam ser ajudadas a terem uma melhor vida financeira.
E, para ser uma influência positiva e transmitir conhecimentos em matéria de educação financeira não é preciso sequer dar palestras, escrever artigos em blog ou postar vídeos no YouTube.
Como você já deve ter percebido acima, basta exteriorizar seus comportamentos perante outras pessoas, tendo um carro mais modesto na garagem (e ficando com ele o maior tempo possível); indo a restaurantes mais simples (por prazer, e não por necessidade 😉 ); e praticando a frugalidade em seus mais diversos níveis.
Tudo isso dá resultado por um motivo bastante elementar: por algum motivo incrustado em nossa genética, em nosso DNA, as pessoas aprendem por imitação. Quando detectamos que alguém tem sucesso financeiro, logo queremos imitar seus hábitos. Não é à toa que, por exemplo, Warren Buffett seja uma das pessoas mais imitadas do mundo em matéria de investimentos e até de hábitos pessoais.
Quando lemos que ele dedica seis horas por dia estudando, queremos imitá-lo também estudando o máximo que pudermos, pois esse é um dos segredos para o sucesso financeiro.
Quando lemos que ele praticava (e na verdade ainda pratica) hábitos frugais, como não ostentar veículos ou relógios ou roupas, também queremos imitar tais comportamentos, pois isso – a vida frugal – é também um dos segredos para uma vida financeira equilibrada.
Quando lemos no excelente livro “O Milionário Mora ao Lado” que a maioria dos milionários de primeira geração nos Estados Unidos têm comportamentos financeiros contraintuitivos (moram em bairros de classe média, não dirigem veículos de luxo, e gastam mais tempo que o cidadão comum organizando seu orçamento doméstico), são esses comportamentos que tendemos a imitar em nossas próprias vidas.
Conclusão

Na verdade, o título desse artigo está um pouco errado. Ser um exemplo em finanças pessoais não é apenas uma das melhores formas de aprender e ensinar.
Se você parar para analisar melhor, ser um exemplo em finanças pessoais é a melhor forma de aprender e ensinar – ou, se preferirem, é a única forma de aprender e ensinar efetivamente bem educação financeira.
E isso pelos exatos motivos listados no começo desse artigo: pelo fato de finanças pessoais ser uma matéria essencialmente prática, que se aprende na escola da vida real, através de erros e acertos, aquisição de conhecimento e feedbacks, tentativas e acertos e aprimoramentos.
E você, já consegue dizer que é um exemplo em finanças pessoais?
Excelente, concordo e estou praticando aos poucos, percebendo bem isso.
Obrigado, Laura!
Muito bom Guilherme, obrigado por compartilhar sempre seus ensinamentos!
Valeu, Carlos!
Ótima matéria, tentando praticar aos poucos e mudando meu mindset.
Obrigada
Valeu, Alexssandra, mudar o mindset é o primeiro passo!
Olá Guilherme!
Voltando aos poucos pela blogosfera por aqui…
Esse ponto de ser um exemplo é excelente, e algo que pensei aqui é” até que pontos nossos filhos podem ser um incentivo para alcançarmos a independência financeira?
Muitos dizer que os filhos geram mais gastos, que atrasam o processo, mas será que não podemos pensar na hipótese de, na nossa responsabilidade em ser um “exemplo” a eles, sermos muito mais efetivos nessa jornada? Será que eles, ao invés de postergar, não geram um efeito contrário?
É uma questão que ainda escreverei no blog.
Abraços e boa semana!
Olá, André, bem vindo de volta à blogosfera!!!!
Olha, realmente é bem interessante e instigante a sua pergunta. E eu acho que sim, eles geram um efeito contrário.
Aguardo seu post!
Abraços e bom final de semana!
Eu sou prova viva de que isso é correto! Tive meus gêmeos à 1 ano e 4 meses atrás e depois do aniversário deles de 1 ano (e de saber dos valores astronômicos que as pessoas pagam por festas de aniversário para crianças), repensei meu modo de viver e consumir. Seguia uma dica aqui e ali mas continuava trocando meu carro a cada 2 anos (0 KM), passei a comprar muitas roupas para os meninos (que mal usavam já perdiam) e tal. Minha primeira iniciativa foi passar a comprar títulos do tesouro com o valor que recebo do auxílio creche, complementando com um pouco mais. Daí coloquei na cabeça que eu e meu marido devemos ser um exemplo para eles e incentivá-los a darem mais valor as pessoas que coisas. Resumindo: estou com um planejamento montado quinquenal, iniciei aplicações, montei um plano para quitar as poucas dividas que temos, olho quase todos os nossos passos diários para identificar onde mais podemos economizar, etc… Conclusão – o retorno e ensinamentos (além das alegrias) que meus filhos estão dando para nós pais é infinitamente muito maior do que os ‘gastos’ que eles geram. Abrs.
Excelentes comentários, Michele!
Obrigado por exemplificar tão bem a tese, Michele!
Guilherme,
“Uma das melhores formas de você aprender finanças pessoais, aprender sobre investimentos, aprender sobre aposentadoria, aprender sobre controle do orçamento doméstico, consiste precisamente em ser um exemplo. ”
Interessante. É uma maneira totalmente diferente de pensar, já que pensamos mais em seguir exemplos e não o contrário.
Querer ser um exemplo naturalmente faz com que as atitudes sejam muito melhor delineadas.
Boa semana,
Verdade, Rosana, pensar fora da caixa nos faz ver as coisas de modo bem diferente!
Bom final de semana!
Estou tentando!!!
E textos como esse são combustíveis para continuar
Obrigado, Marcos, e siga em frente que você conseguirá sim!