Duas conversas distintas, mantidas com dois diferentes amigos, serviram de reflexão para o texto de hoje.
A primeira ocorreu mês passado, onde o amigo em questão narrava o dilema em que se encontrava, sobre o vestibular de Medicina de sua filha. O problema era que ela não estava conseguindo passar em vestibular de universidade pública, e, como todos sabemos, mensalidades da faculdade de Medicina de universidades privadas custam caro, muito caro (entre R$ 5 mil a R$ 9 mil, suponho eu).
Ele dizia que tinha uma reserva que seria destinada para complementar a sua aposentadoria – ele já caminhava para seus 50 anos – e que não queria queimar essa reserva para custear a faculdade da filha. Preferia que ela continuasse tentando a aprovação na faculdade pública.
Mas no final das contas, apesar de todos os esforços dela, o máximo que havia conseguido era a aprovação para ingressar na faculdade privada de Medicina…
A segunda conversa ocorreu mais recentemente, onde uma amiga me contava as dificuldades e os altos custos para tratar a doença da mãe dela, acima de 80 anos de idade.
Entre planos de saúde, remédios, e consultas particulares, o montante de despesas extraordinárias chegou a um valor tal que precisou ser rateado entre os irmãos.
E ela estava se queixando de que, inclusive, precisou mexer em suas reservas financeiras, para que conseguisse cobrir os gastos, principalmente nos últimos dois meses do tratamento, que foram os mais difíceis do ponto de vista emocional, e também os mais caros. Agora, está tudo bem, e ela conseguiu recuperar a saúde, mas à custa de muito sacrifício por parte de todos.
Primeiro: constitua as reservas
Antes propriamente de discorrer sobre o tema central do dia de hoje – não mexer nas reservas – é de fundamental importância mencionar um tema que lhe serve de pressuposto: a própria constituição das reservas, ou seja, a sua formação.
Afinal de contas, para não mexer na reserva, você precisa inicialmente construir a reserva.
E aqui reside um ponto absolutamente crucial das finanças pessoais: tenha uma reserva de emergências. Voltando aos exemplos mencionados acima, se o meu amigo não tivesse formado uma reserva complementar de dinheiro (para custear parte de sua aposentadoria), provavelmente sua filha não teria entrado na faculdade de Medicina.
“Ah, não, mas eu a obrigaria a estudar até passar numa pública”, diriam alguns. Ok, mas é muito fácil argumentar quando não se está sentindo na pele a situação vivida pelas pessoas. E se a sua filha estivesse tentando passar na faculdade pública dos 17 aos 23 anos (imagine seu filho estudando em cursinho durante 6 anos), e, em todos esses anos, ela tivesse obtido aprovação apenas na faculdade privada? Já não seria questão de teimosia continuar insistindo numa coisa cujo transcurso do tempo já não teria ocasionado a perda de inúmeras oportunidades?
No caso da minha amiga cuja mãe estava doente, a reserva de emergências que ela construiu ao longo de toda a sua vida pensando em si mesma teve que ser redirecionada para custear as despesas de sua mãe. Acabou se transformando numa reserva de emergências familiares, e não apenas individual.
Agora, imagina se essa pessoa não tivesse formado sua reserva de emergências… onde estaria a essa altura a mãe dela? Internada num hospital público? Sem receber os remédios prescritos para curar sua doença?
Essas situações da vida demonstram claramente um fato: que muitas vezes aquela reserva de dinheiro que constituímos para a finalidade “x” acaba sendo direcionada para a finalidade “y”.
Imagine você tendo que tirar o dinheiro da previdência privada do tipo PGBL para comprar… um imóvel. É errado? Não é exatamente para isso que serviria um investimento num plano de previdência, que se destina, como o próprio nome diz, a bancar a aposentadoria na velhice. Mas as circunstâncias da vida podem te obrigar a fazer isso: mudar a destinação dinheiro originariamente alocado para certa e determinada finalidade…
Desenhe um planejamento financeiro orientado a multiestratégias
Mas existe algo que pode ser melhorado em sua vida, a partir daquilo que você leu nos parágrafos acima, e acredito que isso é um dos pilares da boa educação financeira aprendida e devidamente apreendida.
Para evitar que haja desvios de rota no dinheiro de sua reserva de emergências, é fundamental que você diversifique as reservas, com base nos múltiplos desafios que a vida irá, nas suas particulares e específicas circunstâncias, lhe cobrar, que podem ser diferentes dos desafios de seu amigo ou mesmo de seu irmão ou cônjuge.
Tomando como ponto de referência o caso acima, do filho que estudará numa faculdade particular de Medicina, se você tem filhos que, em algum momento no futuro, precisarão de recursos financeiros para bancar estudos que exijam maiores gastos, ainda que de forma potencial, é fundamental construir uma reserva específica para tais finalidades.
Sim, além da reserva de emergências tradicional, alocada num investimento conservador de alta liquidez, é recomendável você construir pontes para o futuro de seu filho, fazendo aportes mensais também destinados a bancar os futuros estudos dele.
Para tal finalidade, como o dinheiro tem uma “data certa para morrer”, e como se trata de um investimento com horizonte de longo prazo, com 5 anos, 10 anos, 15 anos ou mais de maturação, você pode ser mais arrojado em sua carteira de investimentos, apostando em produtos que carreguem maior potencial de retorno, ainda que com maior exposição a risco, como debêntures de empresas privadas, fundos imobiliários com contratos atípicos, ações de empresas que tenham um grande potencial de crescimento (ações de crescimento) etc.
Um raciocínio semelhante pode ser empregado para bancar a construção de uma reserva para gastos com saúde, próprios ou de terceiros, além da construção da reserva de emergências.
No Brasil, infelizmente não existem investimentos estruturados para tal finalidade tal como os existentes nos EUA, denominados de health savings account (HSA), que oferecem vantagens tributárias para seus investidores.
Entretanto, nada impede que você monte uma carteira de investimentos destinada a custear esse específico gasto que, infelizmente, é maior quanto maior a idade do beneficiário. Aqui no Brasil, inclusive, não é raro planos de saúde para idosos, que cubram internação em quarto privativo, passarem de R$ 5 mil a mensalidade (!!). E isso fora os gastos com remédios, que têm um peso considerável no orçamento doméstico, e para os quais ter ou não um plano de saúde pouco pode ajudar.
Conclusão

Tudo o que é passível de gasto futuro, principalmente de consideráveis gastos futuros, deve ser mensurado e devidamente provisionado, pois a pior coisa que pode acontecer é você ficar na mão diante de uma necessidade financeira urgente, e para o qual não tenha dinheiro suficiente.
Se ficar devendo já é ruim em qualquer fase da vida, ficar devendo se torna ainda pior quando você tem a partir de uma certa idade, particularmente depois dos 45-50 anos, quando as coisas apertam dos dois lados: tanto do lado dos filhos (a geração posterior à sua), à medida que se aproximam os gastos com faculdade, quanto do lado dos pais (a geração anterior à sua), à medida que vão envelhecendo e precisando de cuidados ainda mais específicos no que tange à saúde, habitação e mobilidade.
Portanto, não deixe para depois o que pode ser feito ainda hoje: controle seus gastos, enxugue seu orçamento, e construa e se abasteça de reservas suficientes e específicas para gastos potenciais, a fim de cobrir gastos inevitáveis que um dia precisarão ser realizados.
Nos dois exemplos mencionados no início do texto, que bom que ainda existiam reservas, que serviram para duas nobres e importantes finalidades (educação – faculdade privada, e manutenção da saúde). Contudo, ambos terão que reconstruir suas reservas se quiserem reconquistar aqueles dois objetivos iniciais – complementação de aposentadoria.
Agora que eles se encaminham para a faixa da meia idade, isso vai ser mais difícil, o que poderia ser evitado se houvesse a formação de reservas suplementares destinadas especificamente a esses dois objetivos.
Daí a importância de sempre ter um padrão de vida sob controle, onde haja menos gastos do que ganhos, e sobre o qual você detenha o controle da saída de dinheiro.
Afinal, é muito melhor prevenir com dinheiro próprio do que remediar, ou se endividar, com dinheiro alheio. 😉
Nossa, essa reflexão é meio que algo que eu sempre faço. Já presenciei doença séria na família e sei o quanto é custoso e desgastante em diversos aspectos. Um dos motivos de eu me preocupar sempre em investir é caso no futuro precise auxiliar meus pais com algum tipo de tratamento (mesmo sabendo que eles tem as próprias reservas para isso) ou, vai saber, para mim mesma, ninguém está livre de ficar doente. A gente nunca sabe, não dá para contar com a sorte em um caso desses, conheço muitas histórias de pessoas que ficaram por anos em cima de uma cama dependendo de cuidados constantes. O que fazer se não existir uma reserva financeira? Infelizmente, parece que a maioria prefere contar apenas, sei lá, com a providência divina, se algo assim ocorrer. Fora que com frequência problemas nunca vem sozinhos…
Verdade, Adriana, precaver é fundamental.
E o que você disse no final da frase é muito real:
“Fora que com frequência problemas nunca vem sozinhos…”
Abraços!
Verdade amigo, é sempre bom ter uma reserva para aqueles momentos inesperados. Parabéns pelo o seu artigo. https://bit.ly/2E3t98h
Obrigado, José!
Sem o exagero de querer ser o morto mais rico do cemitério, preocupe-se, desde cedo, em manter uma reserva de segurança.
Situações inopinadas não avisam sua chegada com antecedência.
Além disso, sua reserva de segurança poderá ajudar na realização de um sonho, seu ou de um ente querido.
Sim, Luiz, uma reserva é sempre algo que nos consola e nos conforta em situações muito desconfortáveis nos aspectos emocional e mental.
Sim, ainda bem que essas pessoas tinham reservas para fazer frente a essas emergências da vida. Durante anos precisei fazer frente as despesas médicas de minha mãe. Embora ela tivesse plano de saúde, apareciam exames que o plano não cobria, remédios caríssimos, acompanhante em certos periodos mais dificeis, etc Fiquei muito feliz em ter recursos para ajudá-la nessa fase da vida.
Que bom que você pôde ajudar, Vânia!
E seu depoimento é mais uma prova viva da importância de guardar dinheiro para essas eventualidades.
Eh pura verdade Guilherme que os planos de saude costumam ter aumentos gigantescos principalmente na ‘ultima’ faixa etaria de 59 anos.
Aquele aumento costuma ser entre 70% e 100%!! – infelizmente inviabilizando os planos para muitas pessoas.
No entanto, tal aumento eh previsivel desde a assinatura do contrato, e poderia ser planejado. Por exemplo, atraves da compra de titulos de Tesouro Direto cujo vencimento coincidiria com aquele evento.
Muito bem lembrado, Michael!
Os planos de saúde são muito custosos para os idosos, e se precaver o quanto antes continua sendo o mais recomendável.
Parabéns Guilherme. Abriu meus olhos não só para diferenciar reservas, mas também para ser mais disciplinado no controle orçamentário. Eu me considero bom no controle, mas falhando muito na execução. Tenho uma renda de 11 reais líquidos, e planejo mensalmente gastar no máximo 8 mil, poupando, aportanto e investindo de 2000 a 3000 reais mensais. Porém, infelizmente é bastante comum eu acabar gastando entre 8 e 9 mil reais só mês, extrapolando o orçamento. Isso muitas vezes é pura falha na execução, gastando mais do que planejado em certos intensas do orçamento, como lazer, passeios, comer fora, etc
Lendo esse texto acendeu a luz vermelha pra mim, nem a amarela foi rsrs preciso URGENTE regular a minha execução orçamentária ao extremo, desde claro, que não fique “sem respirar”, como excelentemente você explicou num artigo aqui no blog
Forte abraço e que Deus te abençoe sempre.
Valeu, DP!
Realmente, o controle orçamentário é essencial sobretudo para “fiscalizar” esses gastos em excesso, que acaba fugindo um pouco do controle, e deixando escapar melhores oportunidades para investimentos.
Abraços, e fica com Deus também!
Olá !
Seu post veio bem a calhar com o momento atual que vivo.
Estava nadando nú (sem reserva de emergência) e apareceu um dinheiro novo que estava pensando em direcionar para a Bolsa ou Exchange.
Após reflexão, decidi colocar no Tesouro Direto e deixar lá.
Minhas reservas sempre foram na B3…rs…não era apegado a ações.
Pra mim, pro meu perfil, era aceitável colocar em renda variável e caso precisasse, teria o dinheiro em D+3. O problema da RV é que ela varia pra baixa também…..so….rs
rsrsr… olá Poney!
Pois é, reserva é reserva, e, na dúvida, é sempre melhor e mais tranquilo optar pelo Tesouro Direto SELIC e deixar lá quieto…rs
Abraços!
Se o indivíduo está se desfazendo da reserva de emergência para pagar a faculdade de Medicina, é notório que essa é uma despesa que ela não pode custear!
Simples assim!