Finalizamos o mês de março com o último guest post da série Os nove desafios do planejamento financeiro.
Os dois textos anteriores foram publicados aqui (parte 1) e aqui (parte 2).
No texto de hoje, o educador Luiz Paulo Guimarães irá discorrer, dentre outros assuntos, sobre taxas de poupança e despesas futuras.
Boa leitura!
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Desafio 7: Baixa taxa de poupança
Poupar aquilo que sobra.
Quem está poupando aquilo que sobra, possivelmente não está poupando o que poderia poupar, pois não está estabelecendo uma meta.
Estabeleça uma meta e começará a guardar dinheiro mais rápido do que aqueles que não o fazem.
A dica não vale apenas para o dinheiro e sua intenção de poupança, mas para tudo que pretende realizar na vida.
O motivo disso?
O ser humano geralmente tende a trabalhar melhor quando possui objetivos claros.
Quando alguém age de maneira aberta, sem uma meta clara, é muito mais fácil se dispersar e focar em outras coisas.
A forma correta de proceder: “gasto o que ganho, já abatido o que tenho que poupar”.
Como definir uma meta de poupança?
Definir metais graduais ajudará a manter o foco no objetivo final, além de fazer com que você lembre o motivo pelo qual está realizando determinada ação, não perdendo, assim, o significado de seu esforço.
Para definir uma meta de poupança, primeiramente defina em sua mente qual é o maior objetivo que você possui relacionado a dinheiro e ao ato de acumulá-lo.
Esse objetivo poderá ser a compra de uma casa própria, de um segundo imóvel como investimento, de um automóvel sem precisar financiar, uma grande viagem de férias ou, ainda, o recebimento, no futuro, de juros que permitam que você pare de trabalhar e viva da renda do seu próprio dinheiro.
Calcule quanto tempo precisará guardar dinheiro para realizar seu sonho: o cálculo do tempo total que terá que economizar está diretamente ligado ao valor que pode guardar todos os meses, os juros que seu investimento pagará e o custo do seu objetivo final.
Considere a seguinte situação:
a) o objetivo é poupar para comprar, sem endividamento bancário, um carro zero no valor hoje de R$ 40.000,00;
b) você é capaz de guardar R$ 800,00 mensais que serão aplicados em investimento cuja rentabilidade seja atrelada ao IPCA (índice que retrata a inflação).
Nesse caso, com uma aplicação de R$ 800,00 mensais, você levaria aproximadamente 43 meses (3 anos e 7 meses) para adquirir seu veículo.
O valor mensal que apresentamos é similar ao que você pagaria em um financiamento de um veículo, caso em que, além dos juros de mercado, você possivelmente desembolsaria um valor como entrada.
Note que, além de não pagar juros, o seu dinheiro ficou aplicado e rendeu, no mínimo, R$ 5.600,00 sem você precisar fazer nada para isso (apenas para simplificar o entendimento dos cálculos eu considerei a rentabilidade da tradicional caderneta de poupança).
Como, por retração do mercado, os preços de automóveis no Brasil, apesar de altos, não vem acompanhando a inflação, é bem provável que você adquira o mesmo carro zero que compraria há 4 anos por R$ 40.000,00, sem pagar juros e ainda desembolsando um valor atualizado menor.
Começar é o mais difícil
Se você está começando agora o seu programa de poupança programada, a primeira coisa a fazer é montar uma planilha detalhada com seus gastos mensais.
Com base nesta planilha, estime o quanto sobra no final do mês, mas seja realista, e faça esforços, senão o mais provável é você acabar vendo que não sobra nada!
Quem está iniciando a carreira
Se você está começando agora sua carreira profissional, e ainda está solteiro(a), então o melhor é começar aos poucos. Estabeleça como meta mínima de poupança algo entre 3 a 5% da sua renda mensal.
Em geral fazem parte deste grupo pessoas mais jovens que acabaram de conseguir sua independência financeira em relação aos pais, e que, por isso mesmo, têm necessidades de consumo reprimidas.
Neste caso é recomendável que se estabeleça inicialmente um percentual mais baixo de poupança, de cerca de 3% e, aos poucos, à medida em que essas necessidades de consumo forem sendo atendidas, o mesmo pode ser elevado até cerca de 10%.
É importante lembrar que cada pessoa é diferente, e que esses percentuais devem ser vistos como indicadores, e não como números fixos, pois devem refletir a realidade de cada um.
Alguns jovens, mesmo sendo solteiros, têm que sustentar os pais e, por isso, poupar pode ser mais difícil.
Estado civil e dependentes influenciam poupança
Com o passar do tempo esse jovem tende a crescer profissionalmente, o que refletirá na sua remuneração; entretanto, é possível que se case, o que pode acarretar gastos extras por um período de tempo, como por exemplo, com a organização do casamento, compra da casa própria etc.
Por outro lado, se o cônjuge também trabalha, a renda familiar aumenta.
Neste caso é preciso rever as metas de poupança, e decidir com seu cônjuge quais as metas que pretendem manter como casal.
Isso é importante pois, caso contrário, se só você poupar e seu cônjuge gastar tudo, pode surgir uma certa frustração, o que não é saudável.
Em geral, no caso de casais sem filhos, o percentual recomendável de poupança varia entre 5% e 15%, sendo o mesmo aplicado sobre a renda familiar.
Essa é a época em que você deve mais se preocupar em poupar, pois, com a chegada dos filhos, os seus gastos tendem a aumentar.
Por seu turno, você provavelmente vai estar em um estágio profissional mais estável, em que aumentos significativos de renda são menos frequentes.
Com a chegada dos filhos, a capacidade de poupança desse casal deve baixar para algo entre 5% a 10%, sendo que o limite inferior se aplica aos casos em que as crianças já estão na escola.
Poupando até a aposentadoria
Com o passar do tempo, os filhos irão terminar os estudos e se encaminhar profissionalmente, atingindo uma independência financeira em relação aos pais; isso permitirá que o casal aumente o percentual de poupança mensal, sobretudo, se ambos ainda estiverem trabalhando.
Considerando que a idade em que as pessoas decidem ter filhos tem aumentado e que a independência financeira em relação aos pais dificilmente é alcançada antes da conclusão do ensino médio ou superior dos mesmos, nesta fase você estará com 50 a 60 anos.
Ao contrário do que se poderia imaginar, mas fruto do aumento da longevidade, é recomendável que você aumente a capacidade de poupança, aproveitando a redução das despesas com os filhos e um possível aumento na sua remuneração.
Afinal, ainda que seja possível se aposentar com 65 anos, o mais provável é que você ainda sobreviva por mais 15 ou 20 anos e nesse caso, se quiser ter uma aposentadoria tranquila, o ideal é poupar cerca de 15% a 20% da sua renda mensal até a data da aposentadoria.
Não se esqueçam: “nos dias de hoje, quando as pessoas são diariamente incentivadas a realizar um sonho de consumo imediato, ao invés de planejar seus gastos, poupar é cada vez mais uma tarefa para poucos”.
Desafio 8: O risco de subestimar despesas futuras
No planejamento financeiro, há que se ter o cuidado de não subestimar despesas futuras, principalmente aquelas relacionadas à saúde e às atividades físicas e lazer.
Despesas com saúde
Vamos tratar, apenas, de despesas alusivas a pessoas que recorrem, exclusivamente, ao sistema privado de saúde.
A população idosa – acima de 60 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) – é bastante heterogênea e, por isso, os custos da velhice podem variar muito e chegar a valores ainda maiores do que os básicos remédios e planos de saúde.
Levantamento recente em São Paulo apresentou os seguintes números:
– dos clientes de uma rede farmacêutica, 75% eram idosos (mais de 60 anos);
– a média de gastos com remédios era de R$ 150,00/mês, ou R$ 1.800,00/ano;
– exames anuais de rotina (urina, sangue e exames de imagem) feitos em laboratório particular sairiam por R$ 3.800,00; a esse valor deve ser acrescido o preço da consulta médica de um geriatra, entre R$ 400,00 e R$ 1.000,00;
– um plano de saúde para maiores de 59 anos, com direito a quarto privativo para internação, pode chegar a R$ 2.500,00/mês ou mais;
– uma casa de repouso custa de R$ 3.000,00 a R$ 5.000,00/mês;
– a contratação de cuidadores (24 horas) chega a custar R$ 12.000,00/mês.
Despesas com atividades físicas e lazer
A prática de atividades físicas regulares é recomendável para todas as idades, de forma a proporcionar saúde e felicidade. Na idade avançada, esta atividade passa a ser indispensável e pode ser realizada, se necessário, a custo mínimo.
Segundo os especialistas:
– as atividades físicas devem ser orientadas por médicos e acompanhadas por profissionais, seja na academia, seja até mesmo em casa, cuidando-se para que sejam evitados os excessos;
– as atividades físicas facilitam a oxigenação do sangue, o melhor trânsito sanguíneo pelas células vitais, o funcionamento mais ativo do cérebro, melhoria nas atividades motoras e melhoria no sistema muscular.
Ainda de acordo com especialistas, o lazer, por seu turno, é extremamente importante para o exercício da memória e trânsito dos hormônios responsáveis pela felicidade.
O lazer para os idosos não é ir até a praça dar milho para aos pombos ou somente jogar dominó com os amigos.
Estas atividades, além de pouco atrativas, não cumprem com a função primordial do lazer, que é a de proporcionar pleno gozo do dia a dia, melhorar as condições de socialização, saúde e, principalmente, a de aumentar a expectativa de vida.
Tanto isto é verdade que a terceira idade tornou-se uma promissora fatia do negócio das agências de turismo, restaurantes, casas noturnas, entre outras alternativas.
Para se ter uma ideia, nos cruzeiros com destino à Europa e aos Estados Unidos, cerca de 45% dos passageiros têm mais de 60 anos.
As agências de turismo constataram que os roteiros mais longos, de navios com mais infraestrutura, são os preferidos.
Obviamente, são também os mais caros. Aqueles que desejarem realizar esse sonho, coloquem isso na lista de previsões de gastos futuros.
Há cruzeiros muito mais baratos mas, em média, uma viagem de sete noites num navio de alto luxo, pode custar US$ 7 mil por pessoa.
Desafio 9: O risco de viver mais do que o patrimônio
Algumas frases abaixo, colhidas de citações diversas de planejadores financeiros, como Gustavo Cerbasi e André Massaro, retratam bem o conteúdo do desafio: “como calcular e gerenciar o patrimônio para que ele não se extinga antes da vida”.
Se no longo prazo estaremos mortos, de que vale apenas poupar, sem se dar a chance de gastar o próprio patrimônio?
É óbvio que não se sugere que a pessoa economize durante a vida toda com vistas a ser o mais rico do cemitério; por outro lado, não se recomenda o gasto desenfreado.
Os recursos economizados para a aposentadoria têm um significado importante e merecem nosso cuidado; desfazer-se deles é quase um sacrilégio. O patrimônio deve ser usado para gerar renda passiva, e não para entrar nos planos dos gastos futuros.
“Não se mexe no principal economizado, a menos que o sujeito faça as contas partindo de uma expectativa de vida muito otimista, para garantir segurança”.
Não dá para brincar com a sorte, não se trata de sovinice; mesmo os que tenham planejado de forma organizada o consumo do patrimônio, estão sujeitos ao risco da longevidade e de viver mais do que o esperado.
Quem cogitar morrer aos 85 anos poderá ter problemas. Para gastar o principal com segurança, é necessário considerar, nas contas, que viverá até os 100.
Não é preciso pensar em fazer o patrimônio crescer, mas não dá para escapar de repô-lo. Para tal, nada melhor do que diversificar as fontes de rentabilidade.
Ficou famoso o caso de Jorginho Guinle. Morreu aos 88 anos de idade morando, por favor dos novos donos, no Copacabana Palace, hotel fundado por seu tio Octávio em 1923, após haver perdido quase todos os seus bens, avaliados em cerca de 100 milhões de dólares, em festas, viagens e mulheres. Declarando com orgulho nunca ter trabalhado, Jorginho ao fim da vida procurava manter o título de “maior playboy do Brasil”, dizendo que “nenhum playboy de hoje pode ser meu sucessor, pois todos têm um grave defeito: eles trabalham” e concluía que: “o segredo do bem viver é morrer sem um centavo no bolso, mas errei o cálculo e o dinheiro acabou antes da hora”.
Segundo cálculos do professor Shlomo Benartzi, da Universidade da Califórnia: “De cada dez pessoas que se aposentam aos 65 anos, é provável que a primeira faleça aos 69, mas a última não deve morrer antes dos 99 anos”.
Essa pessoa pode ser você”.
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Sobre o autor: Luiz Paulo Guimarães: “Morei nos EUA de 1988 a 1990. Minha filha iniciou a cursar o high school em Washington-DC e, no primeiro mês de aula, fui surpreendido. Compunha a grade curricular uma disciplina Financial Education, até então estranha aos meus ouvidos. Passei a acompanhar, passei a gostar. De volta ao Brasil, outras atividades, outras prioridades. Em 2010, após a realização de diversos cursos sobre o assunto, elaborei o Projeto Educação Financeira e iniciei a ministrar palestras e cursos. Infelizmente, ainda há no Brasil um vácuo de conhecimento sobre o assunto, vilão responsável pelo alto nível de endividamento de nossa população. Em 2012 o primeiro livro, Educação Financeira em 3 Capítulos, sonho finalmente realizado. Sou Oficial da Reserva Remunerada da Marinha do Brasil (MB). Por mais de trinta anos, no Brasil e no exterior, exerci diversos cargos de gerência e direção, nas áreas de logística e finanças. Com formação e pós em Administração de Empresas, mestrado em Ciências Navais, fui durante oito anos Diretor Administrativo-Financeiro de empresa estatal (NUCLEBRAS S/A), além de ter dirigido, posteriormente, duas empresas privadas (MULTIIMAGEM LTDA e LBT SINALIZAÇÕES LTDA). Atualmente, sou Palestrante em Cursos de Educação Financeira em empresas, instituições de ensino e na MB”.
Créditos da imagem: Free Digital Photos
Guilherme, obrigado pela oportunidade de usar o seu espaço para divulgar conceitos de educação financeira, assunto que, repito uma vez mais, considero de suma importância para nossa população.
No dia 15 de abril começo um trabalho social na cidade onde resido, Niterói-RJ.
Será um projeto pioneiro no ensino médio público do Estado do Rio de Janeiro.
Vou coordenar e ministrar o Projeo Educação Financeira para o último ano do ensino médio do Colégio Estadual Matemático Joaquim Gomes de Sousa, o Colégio Intercultural Brasil China.
Esse colégio, ainda desconhecido de muitos, é um colégio de ensino médio público trilingue, fruto de uma parceria do Governo do Estado RJ com o Governo da China.
Uma vez mais obrigado e até uma próxima oportunidade.
Finalizando, aproveito para lembrar que palestras “in company” podem ser solicitadas para o email
– lamgcris@gmail.com –
Luiz, nós é quem agradecemos pelas suas valiosas lições, ao mesmo tempo em que o felicito por essa nova jornada no trabalho social.
Realmente, a educação financeira precisa antes de tudo começar nos jovens. Sucesso na sua empreitada!
Luiz, também moro em Niterói, e realmente não sabia da existência desse colégio. Acabei de pesquisar rapidamente a respeito, e achei o conceito simplesmente extraordinário. Me parece o ambiente ideal pra uma empreitada como a sua.
Luiz Paulo,
Muito boa e útil a sua série de posts.
“Quem está poupando aquilo que sobra, possivelmente não está poupando o que poderia poupar, pois não está estabelecendo uma meta.”
Perdemos a referência quando não estabelecemos metas. Um pequeno gasto aqui e outro ali e de repente os pequenos gastos juntos tornaram-se muito significativos. Não que seja errado gastar, mas o consumo consciente é fundamental para que a área financeira fique ao menos minimamente equilibrada.
Além disso, com o tempo isso acaba tornando-se um hábito, o que será muito bom a médio e longo prazo.
Os 2 últimos desafios são muito sérios, mas muito subestimados. Não é raro que o excesso de otimismo atrapalhe que decisões corretas sejam tomadas. Em termos de custos com saúde, não dá para considerar muito as gerações anteriores como referência, pois os custos com tratamentos médicos eram infinitamente menores.
A última frase do post mostra bem o quanto precisamos estar atentos a essa questão.
Boa semana,
Ótimos comentários, Rosana!
De fato, as metas permitem uma aderência maior de nossas atitudes diárias com aquilo que queremos a longo prazo.
Boa semana também!
Muito bom Luiz e Guilherme!
Acredito que o mais desafiador de todos os desafios é o último, em dosar muito bem o usufruto do patrimônio frente à expectativa de vida.
Eu faço um planejamento anual estimando gastos futuros, expectativa de sobrevida, valor desejado para deixar de herança e a taxa de remuneração necessária para meus objetivos. Quando a taxa de remuneração estiver mais baixa do que a remuneração que posso oferecer ao patrimônio, permito-me a aumentar minha previsão de gastos para os próximos anos.
Se nos próximos anos eu avaliar que exagerei (em virtude da taxa estar aumentando), faço o movimento contrário para restabelecer o equilíbrio. Acredito que é uma ferramenta interessante para tomarmos as decisões racionalmente.
O Guilherme e outros blogueiros já conhecem a técnica, mas deixo aqui o link caso alguém deseje se aprofundar: https://www.viagemlenta.com/2019/01/fechamento-anual-da-planilha-de-plano-patrimonial-da-trnp-e-algumas-mudancas-para-o-futuro.html
Abraços!
Excelente depoimento, André!
O planejamento em termos anuais facilita muito a visão sobre como proceder ao nível das ações em nível mensal e diário. Estabelece padrões de conduta mais fáceis de serem avaliados.
Simplicidade e Harmonia/André
Excelentes os blogs. Inscrevi-me nos dois.
Adorei o artigo, deixa eu perguntar uma coisa, vocês estão sabendo algo sobre o 3 congresso nacional de Gestão e Financias? esse aqui hotm.art/QWrNQPR eu me animei para ir, porém não sei se vale a pena