Semana passada, o mundo dos fundos imobiliários ficou agitado – e pegou muitos investidores de surpresa (mais de 8 mil) – com a notícia de que a CVM havia suspendido as negociações de cotas do Fundo Imobiliário Mérito – MFII11.
O inteiro teor da deliberação da CVM pode ser lida a partir desse link.
Segundo a CVM, esse FII vinha “atuando de forma irregular, incluindo o fato de que a sua atuação se assemelha a de uma pirâmide financeira com indícios de fraude, considerando que:
- a) os rendimentos distribuídos pelo Fundo, aparentemente, não refletem o resultado financeiro advindo da gestão de sua carteira;
- b) há indícios de irregularidades da avaliação dos ativos e contabilização de receitas;
- c) o valor auferido a título de taxa de ingresso é reconhecido como receita do Fundo, viabilizando o pagamento de rendimentos em patamar elevado, incompatível com os investimentos realizados, fato que gera uma crescente necessidade de atração de novos cotistas;
- d) houve aprovação em assembleia de uma nova emissão de R$225 milhões, com uma taxa de ingresso de 20%, valor correspondente ao dobro da taxa de ingresso cobrada de novos cotistas na emissão anterior; e
- e) há indícios de gestão fraudulenta da carteira do fundo, inclusive com a realização de investimentos em desconformidade com o disposto no art. 45, da Instrução CVM 472/2008.
O objetivo desse artigo não é entrar, com o perdão do trocadilho, no mérito da questão envolvendo especificamente esse ativo. Para tanto, considero mais apropriado consultar fontes como essa e essa.
O objetivo desse texto é reforçar, uma vez mais, a importância de um conceito que deve fazer parte ativa da vida de qualquer investidor pessoa física: diversificação.
E por quê tratar desse tema?
Simples: porque de tempos em tempos somos informados de quebras de empresas ou de liquidações em bancos, que repercutem negativamente nos investimentos atrelados a tais empresas.
Mês passado mesmo abordamos um caso envolvendo problemas em uma instituição no âmbito da classe renda fixa (post aqui). E hoje pegamos o gancho do MFII11 para reforçar, uma vez mais, a necessidade de utilização de conceitos clássicos e atemporais em investimentos. E o conceito em questão é a tal da diversificação, tão desprezada na prática, e que só vem a ser lembrada em momentos como o atual.
Pra quê diversificar?
Principalmente pra controlar risco. Uma ampla diversificação te protege e ameniza fatos negativos como o que ocorreu com o fundo imobiliário acima mencionado.
Diversificar é distribuir os seus ovos de investimentos em diferentes cestas. É formar uma carteira de ativos que não depende excessivamente do sucesso de um único instrumento financeiro para rentabilizar seu patrimônio, pois esse único instrumento financeiro também pode dar problemas, ocasionando noites sem sono, estresse e, é claro, prejuízo além da conta.
É oportuno, nesse contexto, trazer aqui trechos de um artigo publicado em outubro de 2010.
Você precisa, resumindo tudo em uma palavra, de diversificação. A diversificação é a sua amiga.
E não estou falando apenas de ações bem diversificadas, como vocês já devem estar cansados de tanto ler aqui no blog. Eu vou continuar batendo nessa tecla, porque há muitos leitores que vêm chegando ao blog todos os dias, e é preciso também fornecer a eles princípios de educação financeira reconhecidamente válidos, sólidos e eficazes.
A diversificação é sua amiga porque ela dilui o risco, e maximiza o retorno. Saber diversificar significa escolher ativos financeiros que apresentem baixa correlação, tenham baixos custos e façam seu investimento crescer em qualidade e quantidade.
Como diversificar na renda fixa? Escolhendo ativos prefixados e pós-fixados. Exemplos de ativos prefixados: LTNs, DBs prefixados, fundos de renda fixa. Exemplos de ativos pós-fixados: fundos referenciados DI, LFTs, NTN-Bs, CDBs DI.
Como diversificar em 3 classes de ativos: renda fixa, ações e fundos imobiliários
Diversificação por diversificação não funciona: ela deve ser feita de modo consciente, seletivo e mediante um bom estudo prévio dos ativos a comporem uma carteira.
Na renda fixa, como dissemos acima, você pode alocar a parcela da reserva de emergências em fundos referenciados DI com baixa taxa de administração e no Tesouro SELIC. Já para obter ganhos diferenciados a médio e longo prazos, correndo uma pitada de risco adicional, investimentos em Tesouro IPCA e CDBs de bancos médios e pequenos com prazo de carência maiores, bem como LCAs, LCIs, CRAs e CRIs, também surgem como boas opções, haja vista que tendem a oferecer uma rentabilidade maior que a do CDI.
Em ações, você pode atuar selecionando um mix de ações individuais, se tiver tempo e gostar de acompanhar o mercado, ou pode optar em comprar um pacote de ações, uma cesta de ações, de gestão ativa ou passiva. Sempre preferimos os fundos de gestão passiva, que replicam determinado índice de Bolsa, pois eles tendem a apresentar melhor desempenho a longo prazo. No mercado brasileiro, os casos clássicos de fundos de ações de gestão passiva, com baixas taxas de administração, são representados pelos ETFs BOVA11 e PIBB11.
Por fim, se você deseja investir em fundos imobiliários, não confie todas as suas apostas num único ativo, como deixou bem claro o episódio envolvendo a suspensão de negociação das cotas do MFII11. Procure sempre fazer seu dever de casa, ou seja, pesquisar e estudar bastante, antes de botar o dinheiro nesse ou naquele fundo. E, mesmo após ter feito o investimento, espalhe seus ovos em diferentes cestas, ou seja, compre mais de um fundo imobiliário, para evitar que você fique literalmente “na mão” caso o pior aconteça.
Por fim, existe outra diversificação que vai ser cada vez mais importante: a diversificação entre ativos domésticos e ativos internacionais. Com a facilidade proporcionada pelo surgimento de novas tecnologias, o brasileiro tem acesso cada vez mais fácil e prático aos mercados externos, podendo, assim, construir sua carteira de modo a evitar riscos inerentes aos ativos domésticos.
Conclusão
Sabe por que é tão difícil diversificar? Por causa da ganância exagerada. A ganância exagerada leva as pessoas a realizarem apostas ousadas, concentrando todas as suas fichas num único ativo.
Mesmo que dê tudo certo no futuro, pode ainda dar tudo errado.
Se for para apostar, que ela seja feita com uma parcela controlada de seu patrimônio – digamos, 5% (quem define o percentual é você), mas jamais com 100% de seu patrimônio.
Antes de investir em qualquer ativo que apresente algum elemento de risco mais acentuado, pergunte-se: se esse investimento virar pó, qual é o tamanho máximo de perda dentro do total da carteira que eu posso aguentar? 1%? 5%? 10%?
Faça seus investimentos tendo em mira também esse norte: imaginando um cenário de devastação total do seu ativo, você se sentiria psicologicamente confortável com que tamanho de perda? Essa pergunta é fundamental, e precisa ser respondida com sinceridade e acuidade, a fim de calibrar a dosagem de risco em sua carteira de investimentos.
Em meados de 2013, ficou famosa uma notícia publicada na mídia contando a história de um investidor que perdeu o valor equivalente a um apartamento investindo em ações da OGX.
Uma das histórias recentes de que mais gosto a respeito não propriamente da diversificação, mas sim da paciência na construção da riqueza (que tem tudo a ver com diversificação), é a contada por Florian Bartunek, consagrado gestor de fundos de ações, em suas entrevistas para a mídia especializada em investimentos.
Nelas, Florian costuma dizer que os grandes milionários do Brasil e do mundo são, via de regra, pessoas de cabelos brancos – Warren Buffett, Bill Gates, Jorge Paulo Lehman etc. O que isso quer dizer? Que cabelos brancos indicam necessidade de espera e paciência para ver os resultados dos juros compostos fazerem efeito.
Construção de riqueza é um processo de trabalho árduo, que envolve disciplina, muito estudo, tempo para que os investimentos maturem, e, claro, uma boa dose de diversificação – agora sim no contexto atualizado do artigo.
Ter consistência nos ganhos é muito melhor do que ter ganhos extraordinários pontuais, pois a consistência é um padrão que pode ser replicado periodicamente, enquanto que os ganhos extraordinários não. Aliás, os ganhos extraordinários muitas vezes decorrem da consistência nos investimentos. 😉
Por tudo isso, alocar seus ativos em diferentes classes e subclasses, dosando bem a quantidade e controlando o risco de maneira adequada, são atitudes fundamentais para o investidor ter sucesso na administração de seu patrimônio e, assim, garantir noites de sono mais tranquilas, bem como um patrimônio financeiro mais equilibrado e prudente.
“Sabe por que é tão difícil diversificar? Por causa da ganância exagerada.”
Genial a sua reflexão, simples e direta… esse é realmente o único motivo que nos faz ignorar a diversificação.
Sr. IF365
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Obrigado, SrIF!
Obrigado Guilherme, como sempre uma abordagem didática e serena sobre investimentos. Sou um dos 8 mil investidores da Mérito. Tenho 1 cota do fundo. Estou tranquilo aguardando o desenrolar dos fatos. Diversidficação sempre
Valeu, Moisés! Realmente, ter tranquilidade é fundamental para os investidores do MFII11.
Guilherme,
A suspensão do MFII11 pegou de surpresa muitos investidores e também o próprio mercado de fundos imobiliários, que inevitavelmente será afetado com essa situação.
O mercado tem seus riscos inerentes, mas acho que ninguém pensou em suspensão de negociação como um desses riscos.
Com tantos fundos imobiliários disponíveis atualmente, quantos será que não seguem o mesmo caminho? De qualquer forma, o ocorrido poderá proporcionar um maior amadurecimento desse mercado no país.
Sem dúvida a diversificação é muito importante, para diluir riscos como esse.
Eu havia escrito um post sobre fundos imobiliários para postar amanhã, mas devido ao ocorrido, farei algumas alterações e postarei na próxima terça-, dia 31. Se quiser conferir…
Boa semana!
Oi Rosana!
Claro que conferirei seu artigo! Suas reflexões sempre maduras proporcionam muitos insights valiosos para meditação.
Quanto ao ocorrido no MFII11, acho que pegou todo mundo de surpresa, e deve gerar uma crise de confiança no mercado de fundos imobiliários, afinal de contas, trata-se da primeira suspensão de negociação nesse âmbito. É algo que nunca ocorreu antes – acho que nem com ações deve ter ocorrido algo semelhante e de tal magnitude -, mas se espera que as investigações possam ser conduzidas com profissionalismo e dedicação.
Particularmente, sempre fiquei desconfiado do alto yield praticado por esse fundo, e a reboque disso vem sempre meu pensamento clássico nessa abordagem: quanto maior o retorno, maior o risco embutido.
Abraços!
Olá, Guilherme!
Concordo contigo, diversificação é essencial. Quando combinada a rebalanceamentos periódicos dentro do método de alocação de ativos, é uma excelente forma de gerenciamento de risco. Acaba, como você comentou, sendo um freio para atos emocionais.
Dentro da ideia dos pilares, gosto muito do pilar de câmbio, que pode englobar dólar, euro ou ouro. Acho que, inclusive, ele é muito mais eficiente contra crises sistêmicas do que os investimentos em RV no exterior, pois esses também não estarão protegidos nessas situações. Eu coloco esse pilar na minha alocação mas não o vejo como um pilar de “investimentos” e sim como um pilar de “seguros”.
Abraço!
Oi André, bem lembrada a questão do rebalanceamento, que significa vender caro e comprar barato.
Gostei da sua ideia dos “seguros”, e fazem total sentido num país como o nosso.
Abraços!
Otimo artigo… quanto a investimentos internacionais, sugiro estudar o IVVB11, ETF que segue o SP500, parece uma ótima alternativa.
link https://www.blackrock.com/br/products/251902/ishares-sp-500-fi-em-cotas-de-fundo-de-ndice-inv-no-exterior-fund
Verdade, Gustavo, é uma opção para quem procura ampla diversificação em ações americanas, com a exposição a câmbio garantida.
Abraços!
Acho importante estudar como funciona esquema ponzi. Cada vez aparece num lugar, mas tem certos sinais que se acaba pegando logo de início. Eu tento diversificar bem, empreendimento próprio, td, ações, fii e moeda, ufa. Se eu fosse fera, diversificava menos.
Bem lembrado, Armando, os esquemas ponzi são uma armadilha terrível.
Na história temos vários exemplos desse tipo de trapaça financeira. E é sempre bom estudá-los.
Abraços!
Guilherme. Em tempos de crise o mercado nacional e alta no mercado externo (especialmente nos Estados Unidos) e, devido às dificuldades em investir no exterior, sugiro um “post” sobre investimentos em ativos estrangeiros.
Mais uma vez, parabéns pelo excelente artigo!
Ótima ideia, Márcio Augusto, devidamente anotado aqui!
Abraços!
Bom artigo. Praticar uma boa política de alocação de ativos é uma das mais inteligentes atitudes que um investidor pode (e deve) tomar. Bato nessa tecla desde 2002, quando o assunto ainda provocava olhares de estranheza nos investidores pessoa física. De lá pra cá, quem adotou a técnica prosperou, e infelizmente, muitos que não deram bola, acabaram ficando pelo caminho.
E concordo totalmente com o Andre R Azevedo quando diz que uma cesta cambial é muito mais eficiente contra crises sistêmicas.
Abraços.
Olá, Jonas!
É uma honra tê-lo comentando aqui no blog! Acompanho seu trabalho desde o começo dessa década, e aprendi (e aprendo) bastante com seus ensinamentos focados em alocação de ativos e proteção de capital.
Concordo com o que você disse, uma estratégia equilibrada de investimentos não pode desprezar alocação de ativos, rebalanceamentos periódicos, e proteções de carteira.
Abraços!