Um leitor me enviou um questionamento muito interessante, que resolvi transformar em post, pois as reflexões oriundas desse caso podem ser aproveitadas por um número bem maior de famílias leitoras do blog.
Diz ele, pai de duas crianças, que a época de final de ano é bastante difícil de administrar, sob o ângulo financeiro, tendo em vista que as crianças sempre ficam insistindo em ganhar presentes, e, a cada ano que passa, elas querem presentes cada vez mais caros e sofisticados.
Essa situação ficou pior nesse ano, pois a empresa onde ele trabalha decidiu não promover reajuste nos salários, e ele teve que se contentar em continuar no trabalho, o que por si só já foi motivo de vitória, uma vez que várias pessoas do quadro de pessoal foram simplesmente demitidas, em face da severa crise que atinge milhares de empresas no Brasil, e que acabou atingindo a empresa dele também.
Bom, como semanas atrás eu abordei um tema financeiro ligado aos DRSCs ou DINKs (casais sem filhos), achei que era hora apropriada de abordar um tema financeiro ligado a outra significativa parcela de leitores do blog: a dos leitores com filhos.
E o recado do artigo de hoje é simples e direto: crianças não precisam de presentes dos pais; crianças precisam da presença dos pais.
Apesar de essa mensagem soar um tanto quanto óbvia, não é isso que vemos sendo praticado nos lares das famílias brasileiras (o que prova, mais uma vez, quão difícil é praticar o óbvio).
Hoje em dia, o que eu testemunho é o fato de muitos pais, por questões de comodidade, que na verdade revelam o desejo oculto de não assumir responsabilidades e deveres, acabam substituindo a presença, tão necessária e tão importante para a formação e desenvolvimento humanístico deles, por presentes. Por coisas materiais. Por objetos.
Exemplo: os pais, em vez de gastarem tempo interagindo e, por tabela, marcando presença, com os filhos, através de brincadeiras, leituras de histórias, ou conversas, preferem, por questões de pura comodidade, dar a eles celulares e tablets, pois sabem que esses aparelhos eletrônicos deixam as crianças “ocupadas”, não dando trabalho, no sentido de, quando elas estão ocupadas com os celulares e tablets, elas acabam ficando quietas. A presença é integralmente substituída por presentes.
Será que isso vai funcionar para sempre? Quais as consequências a longo prazo de comportamentos que privilegiam o “alívio” (se é que isso pode ser chamado de “alívio”) de substituir o contato humano pelo contato com aparelhos? Quais as implicações para os relacionamentos interpessoais que tais atitudes podem causar, no desenvolvimento psíquico e emocional das crianças?
Será que não estamos assistindo à formação de uma geração de pessoas que sabem como ninguém se conectar, mas que, ao mesmo tempo, não sabem se relacionar?
Não tem problema algum se você não tem dinheiro para bancar o Xbox One ou o iPhone 7 para sua criança (e acredite, tem muita criança por aí sendo contemplada com esse tipo de “brinquedo”, geralmente por pais que preferem gastar dinheiro com crianças, em vez de gastar tempo com elas).
Problema tem, e dos grandes, se você achar que vai ser o melhor pai ou mãe do mundo se atender a todos os desejos materiais de seus filhos.
Na verdade, você precisa entender o funcionamento da mente das crianças.
As crianças têm uma necessidade intrínseca de se relacionar com outras pessoas, principalmente com os pais. E os pais devem aproveitar essa fase para nutrir as crianças com todos os ingredientes básicos para construção do caráter e valores, que serão tão importantes no futuro. Como? Gastando tempo com elas!
Por isso, em vez de gastar dinheiro comprando brinquedos caros e que daqui a um ano serão pouco úteis, prefira gastar seu tempo brincando com elas, jogando com elas, se divertindo com elas, contando histórias para elas.
Pais conscientes de seu papel na formação das crianças priorizam o gasto do tempo com as crianças. Eles priorizam a presença. O gasto de dinheiro acaba sendo secundário.
Pais não conscientes priorizam o gasto de dinheiro com as crianças. O gasto de tempo acaba sendo secundário.
Conclusão
Você tem sido um pai (ou mãe) presente? Ou você prefere dar presentes?
A maior dificuldade das pessoas hoje em dia é se doar, e isso se reflete em muitas famílias brasileiras.
O ato de criação e educação dos filhos é um ato absolutamente indelegável: cabe aos pais o papel primordial de educá-los e formá-los para enfrentar os grandes desafios que a vida lhes imporá.
As necessidades materiais das crianças são muito pequenas. Elas não têm estrutura psíquica pra diferenciar um iPhone 7 Plus de 256 GB de um Samsung usado de R$ 300. Não é isso que vai fazê-la melhor ou pior.
Necessidades são distintas de desejos, e o que você precisa, enquanto pai/mãe, é suprir as necessidades delas, que são mais imateriais do que materiais.
O que as crianças precisam, hoje em dia, é de menos presentes, e de mais presença dos pais. Isso sim é que fará toda a diferença para elas no futuro.
Nesse Natal, que você possa gastar mais tempo com elas, e menos dinheiro. Acredite: é desse jeito que a educação delas tomará um rumo melhor. 🙂
Olá Guilherme!
Concordo com tudo que disse. O desenvolvimento da personalidade, do caráter e dos valores da criança está intimamente ligado à presença dos pais em sua vida.
Mas precisamos enfrentar que hoje eles (os pais) sofrem uma concorrência enorme, muitas vezes injusta, com a mídia (que impele a fazer com que nos contentemos com “coisas”, em “ter” e não “ser”) e com o Estado, que quer cada vez mais tomar conta de nossas crianças, decidindo o que eles podem aprender, ver, consumir, etc.
Ser pai hoje em dia não é fácil rsrs
Abraço!
Olá André, é verdade!
Hoje em dia, influências externas potencialmente negativas, como as que você citou, tornam cada vez mais difícil a tarefa de educação das crianças.
Abraços!
Olá Guilherme!
Perfeito texto! A se as pessoas gastassem mais “tempo” ao invés de dinheiro com as crianças….
Infelizmente muitos querem ser pais, mas não querem doar seu tempo as crianças…
Outra questão que seria legal abordar é a questão das pessoas “serem” obrigadas a dar presentes. (não falo aqui só das crianças, mas no geral) Não sei de onde vem essa cultura que para qualquer evento que você vá, você leva um presente… As pessoas querem nossa presença ou nosso presente?
Abraços!
Olá II, obrigado!
Realmente, a cultura dos “presentes” é bem forte na sociedade atual, além de ser bastante fomentada pela mídia e os grandes grupos econômicos.
Abraços!
Guilherme,
Na minha família abolimos os presentes obrigatórios, então é normal ter aniversário/natal/dia das crianças sem presente. Quando algum de nós vê algo que gostaríamos de presentear alguém da família (e essa pessoa precisa disso) compramos e damos em qualquer época do ano.
Não sofremos por isso e acabamos tendo tempo e dinheiro para fazer mais coisas juntos! Mesmo meus sobrinhos de 11 e 16 anos já estão acostumados.
Ótimo texto! Sempre bem escrito e pertinente! Abraços
Olá, Adriano, obrigado!
Parabéns pelo exemplo! Educar os filhos e sobrinhos nessa empreitada é uma grande conquista, sem dúvida.
Abraços!
Realmente, ser pai (ou mãe, tanto faz) hj em dia não é fácil. Na verdade nunca foi, mas hj as pessoas são cada vez menos preparadas pra isso e mesmo assim insistem nessa escolha (sim, ter ou não ter filhos geralmente envolve escolhas). Além dessa falta de preparo, sempre tem aquela questão de “querer dar pro filho tudo que não teve” e o resultado são filhos mimados e que não dão valor às coisas que tem. É muito mais fácil para um pai que não tem dinheiro sobrando falar que não pode dar aquele XBox One pq não tem grana do que um pai que tem grana (ou que pode se sacrificar um pouco para agradar o filho) falar que não vai dar pq não vai. Na primeira situação, o pai não pode. Na segunda o pai pode, mas não vai. E como, hj, os pais passam cada vez menos tempo com os filhos eles simplesmente trocam “presença” por “presentes”.
Não vou negar, presentes são ótimos. Lembro até hj do meu primeiro (e único) videogame, um SNES que ganhei no natal de 1997 com meus 7 anos de idade. Aquele videogame fez parte da minha infância. Mas meus pais também fizeram parte dela e tenho muito a agradecer a eles. Não me deram tudo que eu pedi (até pq não podiam) mas estavam lá qdo eu precisava.
Não pretendo ter filhos. Talvez qdo tiver uns 35, 40 anos eu mude de ideia. Criança nunca foi a minha praia. Mas se um dia eu tiver, quero garantir que vou estar lá pra criar ele(a) da maneira q eu acho mais certo. Proteger ele(a) das influências ruins externas (os esquerdismos, feminismos, venenos alimentícios, excesso de eletrônicos, televisão, entre outras coisas).
Olá José, obrigado!
Gostei particularmente desse trecho:
“Além dessa falta de preparo, sempre tem aquela questão de “querer dar pro filho tudo que não teve” e o resultado são filhos mimados e que não dão valor às coisas que tem”.
O que mais se vê hoje são filhos mimados. Se eles querem um celular, e são atendidos, partem pra próxima etapa, que é um presente mais caro. Saber impor limites é uma das maiores tarefas dos pais.
Guilherme, seus artigos são incríveis, sempre abrindo nosso olhos para uma nova realidade.
Abraço
Valeu, Rafa, pelas palavras!
Só quem teve uma infância sem a presença do pai, por estar sempre trabalhando, sabe exatamente o que isso representa na vida da criança … Ou melhor: da pessoa. Essa “experiência” é carregada pela vida inteira …
Pior ainda são os que não estão trabalhando, mas tratam de “se ocupar” para poder justificar a ausência da vida dos filhos. =(
Entre um presente caro (que nunca tive) e uma tarde de sábado com a sua criança, escolha o tempo com ela. No futuro você verá que terá valido MUITO a pena ! (e ela também, hehehe)
Abraços !
Verdade, Zé, você disse tudo! 🙂
Engraçado que isso me lembra o “teste da ausência sentida”. O que a criança vai sentir mais falta: 10 anos sem ganhar presentes materiais, ou 10 anos sem ganhar a presença do pai? 😉
Abraços!
A 3ª alternativa … “os dois” … 🙁
Verdade… 🙁
Ola Guilherme belo artigo!
Eu curto bastante artigos voltados para crianças, a minha nasceu faz um mês apenas, mais tenho uma de 13 anos que é minha irmã, e na minha humilde opinião o que mais acontece nos lares Brasileiros é a mídia em massa, onde a publicidade não da trégua e invade a cabeça destas crianças, se você assistir um desenho animado com seu filho verá que a publicidade é mais apelativa que a publicidade para adultos, ou seja, ao invés de largar as crianças na frente da sua TV que tal dar para ela um livro, ou uma noite (a maioria ve os filhos a noite) de brincadeiras que façam as crianças se divertirem e esquecerem akela sandalia da moda ou o IPhone 7, tem um documentário que exemplifica bem o que você escreveu, há em paises desenvolvidos a proibição (voces leram bem PROIBIÇÃO) de publicidade voltada pra crianças, sera´que no Brasil seria necessaria uma proibição destas? Segue o link abaixo do Doc que se chama Criança a Alma do Negócio.
Parabéns pelo artigo…
Olá Tiago, excelentes comentários!
De fato, deixar a criança largada na TV, e não controlar as horas que ela passa em frente da televisão, pode ter efeitos bastante negativos sobre a mente delas, em função da publicidade agressiva de consumo.
Abraços!
Este é um dos dilemas dos pais de hoje em dia. Muitos ainda confundem prover os filhos com bons presentes, boas escolas, boas babás, boa comida, boa roupa, com ser bons pais. Acho que isto está longe de mudar. Comparo a minha vida com a vida de uma irmã, que é médica e por isto quase não está em casa pois leva aquela vida atribulada de plantão em plantão.
Eu trabalho em casa, vejo o Uozinho o tempo todo. Sim, devo ganhar metade que a minha irmã ganha em termos de $$$, porém, ganho em outros níveis da relação.
Sei que ela tem muito amor a dar aos filhos, assim como eu, mas falta tempo. Mesmo que ela queira, o tempo de qualidade não está ao alcance dela.
É o que se paga hoje pelo sucesso profissional. Difícil é equilibrar isto.
Abraço!
De fato, uó, bastante difícil equilibrar essa relação.
Você disse uma palavra-chave: tempo de qualidade. Isso é fundamental para o bom desenvolvimento das crianças: não gastar apenas o tempo, mas um tempo que possa ser proveitoso e útil.
Abraços!
Bela mensagem, Guilherme!
Este deveria ser um apelo à sociedade. Não por acaso as sociedades tradicionais (ou as que sobraram delas; geralmente encontradas em locais afastados do globo) são sociedades mais pacíficas e respeitosas (pelo menos consigo próprias), pois vivem ligadas aos seus pais e anciões, donde interagem e mantêm vivo o tecido que liga uma geração à outra.
Outra coisa importante, e que está relacionada à vivência pais-filhos, é o que os pais passam aos filhos nos momentos em que estão juntos. Muitos pais, infelizmente, não repassam comportamentos e modos de viver tão virtuosos, digamos assim. Coisas como ficar deitado ao sofá quando se tem tempo livre, jogar conversa fora a todo o instante, o ser preguiçoso para tudo, assistir programas de TV inúteis em vez de fazer alguma coisa edificante. Enfim, a lista de vícios é enorme. Se os pais tivessem consciência do papel que têm, provavelmente buscariam uma melhor educação aos filhos.
Algumas coisas interessantes que me aconteceram, quando criança, e que me marcaram positivamente foram os conselhos e atitudes de meus pais quanto à polidez, ao equilíbrio no pensar e agir, à postura, ao ouvir os mais velhos (mas percebendo se o que eles dizem é válido ou não), ao estímulo à leitura, ao cuidado com o corpo/saúde (mais minha mãe, que dizia: “corpo forte, saúde em dia”), ao poupar em vez de consumir tudo ou desperdiçar, e outras coisas mais. Isso é, considerando os bons comportamentos, sem contar os ensinos morais e éticos.
Um dos maiores absurdos que um pai pode cometer a uma criança é simplesmente ignorá-la. Um exemplo é quando uma criança pergunta: “Pai, o que é isso?”, e o adulto simplesmente a manda calar-se ou parar de falar besteira. É uma atitude estúpida e que bloqueia a capacidade da criança de apreender o mundo, limitá-la ao descobrimento das coisas.
Enfim, é um tema que poderia, ou melhor, deveria ser abordado e trabalhado entre todos os pais.
Excelentes comentários, Anderson!
De fato, as crianças aprendem muito por imitação, de modo que os pais também devem estar atentos não só ao que dizem, mas também ao que fazem.
Gostei muito do seu penúltimo parágrafo: há de se ter paciência e saber explicar e transmitir conhecimentos às crianças, principalmente quando elas estão na fase da curiosidade.
Abraços!
Parabéns Guilherme por mais um artigo sensacional, que nos leva a refletir sobre uma série de escolhas que temos feito!
Curiosamente, um dos melhores textos que li sobre presentes e crianças não foi em um livro de educação financeira, mas sim de antropologia, no caso “O suplício do papai noel” do Levi-Strauss.
“Pois de onde vem a idéia de que as crianças têm direitos, e que tais direitos se impõem de forma tão imperiosa aos adultos que estes são obrigados a elaborar mitos e rituais custosos e complicados para conseguir contê-los e limitá-los? Logo percebemos que a crença em Papai Noel não é apenas uma mistificação agradavelmente imposta pelos adultos às crianças; é, em larga medida, o resultado de uma negociação muito onerosa entre as duas gerações.
Abraços
Sandro, obrigado!
Gostei muito desse trecho do livro. Realmente, essas crenças e tradições têm origens que devemos sempre questionar.
Abraços!
Boa mensagem, Guilherme! Muitas reflexões importantes ao longo do texto e dos comentários. Gostei que você publicou um texto voltado para os pais, logo depois de ter feito um texto para aqueles que não tem filhos! Justo, justíssimo!
Ser mãe/pai de verdade requer muita paciência e doação. É você, muitas vezes, querer assistir um filme de adulto, ver seus whatsapp, conversar com uma amiga, ler um livro ou simplesmente descansar numa rede e não poder, se quiser ser uma mãe/pai presente. É você sempre procurar pensar no filho e depois em você.
Entendo os que não querem ter filhos. Acho que se deve respeitar essa decisão. Pior seria se não quisesse, mas tivesse apenas para seguir o padrão da maioria ou para não decepcionar sua família.
Ser mãe e pai muda a vida completamente. É você deixar sua própria vida em segundo plano em muitas vezes. A presença é sem dúvidas o maior presente que você pode dar a alguém.
Somos exemplos. Para que ter um iPhone 7 se nós, mães/pais, não temos e vivemos muito bem, obrigado! A conversa com seu filho é o que se tem de mais importante na vida.
Olá, Isabela, obrigado e ótimos comentários também!
É verdade, a decisão de ser pai/mãe é uma decisão carregada de responsabilidades, por isso, deve ser planejada com bastante cuidado.
Abraços!