Não, você não leu errado.
Num mundo em que a maioria das pessoas e empresas lutam para conseguir meios para ganhar “mais tempo”, a fim de serem mais eficientes, produzirem mais, desempenharem mais, e entregarem mais resultados, soa quase como uma “heresia” dizer que, para você ser mais produtivo, você deve “perder tempo”.
Porém, aquilo que é contra-intuitivo às vezes funciona melhor. E, nesse caso específico, funciona de fato. Mas por quê?
Por uma razão muito simples: nós não somos máquinas.
Por muito tempo acreditou-se que o nosso funcionamento no trabalho e na vida pessoal deveria se assemelhar ao funcionamento das máquinas. Ou seja, quanto mais tempo “ligados na tomada”, trabalhando sem cessar, sem interrupções, sem intervalos, mais resultado conseguiríamos obter, mais coisas conseguiríamos fazer, mais negócios conseguiríamos fechar, mais atividades conseguiríamos desempenhar.
Mas as coisas não funcionam assim, uma vez que, ao contrário das máquinas, que podem funcionar de modo linear, sem interrupção nem intervalo, as nossas vidas não são lineares.
A comparação entre computadores e seres humanos é uma comparação equivocada, pois nós funcionamos melhor, seja no nível físico, seja no nível mental, seja ainda no nível emocional, quando intercalamos períodos de atividade com períodos de descanso.
Ou seja, somos “máquinas” que, ao contrário dos computadores, precisam trabalhar em ondas, consumindo energia, e renovando energia, de modo intermitente.
É por isso que ficamos acordados durante o dia, e precisamos dormir à noite. O sono revigora nossas funções metabólicas e biológicas, e uma boa noite de sono é capaz até mesmo de curar problemas de saúde – quem nunca?
É por isso que você tem aulas que não ocorrem de maneira ininterrupta: é necessário um intervalo de pelo menos alguns minutos para você absorver o conhecimento e renovar sua energia mental.
É por isso que você precisa de finais de semana para descansar após uma semana inteira de trabalho, ou mesmo de alguns dias de férias após meses de trabalho semanal contínuo: para reabastecer suas fontes de energia, sobretudo as de ordem mental e emocional.
É por isso que você não consegue prender a respiração por muito tempo. Observe que até nos níveis mais básicos de nossas funções corpóreas, precisamos consumir energia (respirando) e renová-la de maneira intermitente (expirando).
Dessa forma, para que você consiga render mais no trabalho, e render mais na sua própria vida pessoal, é preciso “perder tempo”.
Descanse mais.
Encare seus intervalos de tempo, seja o intervalo entre as aulas, o intervalo numa jornada de trabalho, os finais de semana e feriados, e mesmo as férias, como períodos excelentes para você renovar sua energia, em suas múltiplas dimensões – física, mental, emocional e espiritual.
Ao realizar essa prática de “perda de tempo”, mas de modo consciente, você ganhará uma série de benefícios: acumulará uma perspectiva mais ampla sobre suas atividades, pensará de forma mais reflexiva e em termos de longo prazo, terá oportunidade de absorver e metabolizar melhor suas experiências, e até rejuvenescerá de forma mais consistente – incluindo os fios de cabelo branco que você evitará (e que tem sido cada vez mais comum até em pessoas na faixa dos seus 30 e poucos anos).
Assim como é preciso quebrar o mito de que somos seres programados para sermos multitarefas, é preciso também derrubar a crença de que somos mais produtivos quando trabalhamos continuamente, em alta velocidade, por períodos prolongados de tempo.
Isso não funciona.
Não somos as máquinas que devemos operar. Somos seres humanos “configurados” para trabalhar e descansar; estar alerta durante o dia e dormir à noite; trabalhar com elevada intensidade, mas em períodos limitados de tempo; e descansar de modo suficiente para renovarmos nossos níveis energéticos.
Quando devemos perder tempo? Trabalhe com ciclos de 90 minutos.
E aqui vem uma pergunta inevitável: quando deve ser o momento de “perder tempo”? Ou seja, de dar uma pausa para “respirar”?
Em muitas atividades, o período de intervalo para descanso já vem pré-programado, tais como em aulas, algumas profissões como telemarketing, atendimento bancário etc. Mas em muitas outras não existe esse marco interruptivo.
De acordo com Tony Schwartz, especialista na área do conhecimento humano envolvendo produtividade pessoal, e que já foi autor de um livro que resenhamos aqui no blog, vários estudos científicos convergem no sentido de que devemos dar um descanso após 90 minutos de intensa atividade. Em um artigo publicado no New York Times, em fevereiro do ano passado, ele afirma:
“Working in 90-minute intervals turns out to be a prescription for maximizing productivity. Professor K. Anders Ericsson and his colleagues at Florida State University have studied elite performers, including musicians, athletes, actors and chess players. In each of these fields, Dr. Ericsson found that the best performers typically practice in uninterrupted sessions that last no more than 90 minutes. They begin in the morning, take a break between sessions, and rarely work for more than four and a half hours in any given day”.
Numa tradução livre:
“Trabalhar em intervalos de 90 minutos parece ser uma receita para maximizar a produtividade. O Dr. K. Anders Ericsson e seus colegas da Universidade Estadual da Flórida estudaram profissionais de elite, incluindo músicos, atletas, atores e jogadores de xadrez. Em cada um desses campos, Dr. Ericsson descobriu que os melhores desempenhos tipicamente ocorreram em sessões ininterruptas que não duraram mais do que 90 minutos. Eles começavam pela manhã, faziam uma pausa entre as sessões, e raramente trabalhavam durante mais do que quatro horas a quatro horas e meia em um determinado dia”.
Eu fiz esse teste dos 90 minutos durante os últimos tempos, e tem funcionado a contento.
Aliás, essa regra dos 90 minutos pode ser aplicada em várias áreas de sua vida, e não apenas no trabalho estritamente considerado.
Vai fazer uma viagem de carro que dure cerca de 3 horas? Vá num posto de combustível aproximadamente após 1h30min dirigindo.
Vai escrever um artigo em seu blog? Dê uma pausa após 90 minutos de escrita.
Vai assistir um filme que tenha 3 horas de duração? Dê um break na metade do vídeo.
Vai na academia treinar? Programe seu treino para que ele não dure mais do que 90 minutos (se bem que o ideal é que – se for treinamento de força de alta intensidade como musculação – ele não dure mais do que 40 a 50 minutos, para não desgastar excessivamente seu corpo e você entrar no overtraining).
Vai ler um livro no final de semana? Programe-se para fazer uma pausa para descanso mental após 90 minutos de leitura.
Conclusão
Não importa a atividade que esteja realizando, procure perder tempo. “Perder tempo”, aqui, não tem a ver com perda de produtividade pessoal, mas sim com seu oposto, pois é durante o descanso, seja ele mental, seja ele físico, seja ele ainda emocional ou espiritual, é que nos reabastecemos com energia suficiente para começar a próxima etapa da atividade que estejamos realizando.
Ou seja, “perder tempo” é uma maneira excelente e eficazmente comprovada de ganhar energia, que nos impulsionará a fazer com que as próximas horas de nossa atividade sejam ainda mais produtivas. 🙂
Exato. O importante é o equilíbrio. É como a história da galinha dos ovos de ouro. Para continuar produzindo os ovos, temos que cuidar da galinha. Sem galinha, sem ovos. Muitas vezes, “perder tempo” significa fortalecer nós mesmos para que possamos ser mais produtivos, ou fazer mais em menos tempo, a seguir.
Isso mesmo, André, cuidar da fonte (galinha) é essencial para que os frutos (ovos) sejam produzidos. Gostei da comparação!
Abç
Excelente post, Guilherme!
Obrigado, Célia!
Eu tenho “trabalhado” com períodos de 40min e intervalos de 5. Foi o melhor custo x benefício que encontrei.
Tentei com mais tempo (50, 60, 80 minutos), mas começava a ficar muito disperso. Com menos tempo eu não chegava a alcançar um pico de produtividade.
Muito bom o texto, como sempre!
Excelente, I.C.!
Realmente, os ciclos de produtividade dependem de diversos fatores, incluindo a individualidade biológica e psicológica.
O importante é achar o que funciona melhor para suas necessidades específicas.
Abç!
Cara, muito bem. Gostei!
Obrigado, Dirlene!
Já levava esta ideia nos estudos para concurso. E acabei tentando incorporar no trabalho, e realmente surtiu efeitos satisfatórios. Ao final do dia não se sente aquele “peso” de quem passou o dia trabalhando, enfrentando a rotina de trânsito, resolução de problemas no trabalho, etc.
Outro momento importante é o descanso após o almoço. Não precisa dormir, nem ser uma cochilada longa. Ao menos sentar sem fazer nada por 15 minutos já me satisfaz.
Ótimo post!
Exato, Felipe, essas pausas para renovação criam um ambiente interno extremamente favorável para termos mais energia para as tarefas seguintes!
Abç
Guilherme,
Gostei muito da dica dos ciclos de 90 minutos. Eu comecei a praticar primeiramente nas atividades que necessitem de concentração e posso dizer que funcionou muito bem para mim. 🙂
Que legal que tenha funcionado para você, Rosana!
E é justamente nas atividades de concentração que eu acho que os ciclos de 90 minutos tendem a ter o máximo de aproveitamento. 😀
Abç!