Essa é terceira parte da mega-resenha sobre a biografia de Warren Buffett, “A bola de neve: Warren Buffett e o negócio da vida“, de Alice Schroeder. A primeira parte, que fala sobre sua família e sobre sua incrível e impressionante precocidade no mundo dos negócios, pode ser lida aqui. E a segunda parte, cujo sub-título é: “A lenda”, e trata dos aspectos profissionais que fizerem dele o maior investidor de todos os tempos, pode ser lida aqui.
No texto anterior, analisamos como Warren Buffett conseguiu amealhar um patrimônio de bilhões de dólares usando, basicamente, a força de seus conhecimentos, acumulados ao longo de décadas, somados ao seu talento para negociar, e sua ampla rede de relacionamentos, constituída de parceiros de negócios com os quais compartilhava um mesmo código de valores. Agora, iremos analisar uma outra faceta dessa personalidade complexa de Warren, a de celebridade.
Embora a fama de Buffett como talentoso gestor de recursos viesse se alastrando gradativamente no decorrer dos anos e das décadas, foi o episódio ocorrido com o problemático banco de investimentos Salomon Brothers, no começo dos anos 90, que definitivamente fez Buffett cair nas graças do povo americano, como o herói, o bom mocinho, a combater os vilões de Wall Street, os quais não pensam em outra coisa senão sugar os investidores com táticas inescrupulosas e meios muitas vezes ilícitos para captar recursos, como esse sujeito aqui.
Ciente de sua própria fama, da qual sinceramente gostava, Buffett passou então a usá-la para influenciar eventos e ideias. Warren gostava, sobretudo, de atuar como professor, sendo cada vez mais requisitado para dar palestras em universidades espalhadas por todo o País. Ele não só tinha carisma, como também era dotado de uma grande capacidade de comunicação, conseguindo transmitir seus conceitos acerca dos negócios de maneira que todo mundo entendia, o que muitas vezes ocorria por meio de metáforas.
A reunião anual dos acionistas da Berkshire Hathaway, na cidade de Omaha, também ficou famosa mundialmente, sendo conhecida como a Woodstock do capitalismo. Era, e ainda é, uma grande maneira de Buffett comunicar suas mensagens, bem como expor os milhares de produtos comercializados, produzidos ou fabricados pelas empresas que estão sob seu controle acionário. Nesses eventos, Buffett demonstra todo seu carisma, como no vídeo abaixo em que “duela” na mesa de ping-pong com uma campeã mirim chinesa:
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Warren sempre resistiu a fazer um “split” das cotações da sua empresa, listada na Bolsa de Nova York sob o código BRK. “Split” significa fazer um desdobramento das ações, dividindo-a, “fatiando-a” em porções menores (mas sem alterar artificialmente o valor de mercado da empresa), a fim de, dentre outros motivos, tornar mais fácil sua negociação no mercado. P.ex., fazer um split de uma ação negociada a $ 50 significa, hipoteticamente, desdobrá-la em duas de 25. Assim, o acionista que possuísse 1 ação de $ 50, passaria a deter duas ações de $ 25. No momento em que esse artigo estava sendo escrito, uma única ação da Berkshire, da classe A, valia nada mais nada menos do que 112 mil dólares. Outra peculiaridade da Berkshire é nunca distribuir dividendos, preferindo Buffett reinvestir os lucros da empresa na aquisição de mais empresas para o conglomerado financeiro.
A partir dos anos 2000, à medida que sua idade avançava e começavam a surgir rumores sobre seus possíveis sucessores, Buffett passou seriamente a considerar a possibilidade de fazer mais doações para a filantropia. Na verdade, ele já tinha uma fundação há mais de 40 anos, para o qual vertia contribuições regularmente, mas novas reflexões surgiram depois que sua esposa morreu, em 2004, vítima de um câncer. Esse episódio foi especialmente doloroso para Buffett, pois sua mulher era, apesar da separação, o seu porto seguro emocional, alguém a quem podia recorrer mesmo nos momentos mais difíceis. Só que agora ela não estava lá…
De maneira inesperada, Buffett surpreendeu o mundo ao dizer, em 2006, que iria de desfazer de mais de 85% de sua fortuna pessoal, gradativamente, doando-a para a fundação de Bill e Melinda Gates. Isso correspondia a incríveis 37 bilhões de dólares na época. Tratava-se da maior doação feita em toda a história da filantropia. Buffett não só era o investidor em ações mais bem sucedido de todos os tempos, como acabava de se tornar também o maior filantropo de todos os tempos. Um homem que passou a vida inteira acumulando dinheiro, como se fosse uma bola de neve, estava se desfazendo dela, sem deixar praticamente nada em seu nome. E mais: sem controlar pessoalmente como essa montanha de dinheiro seria gasta. Isso subvertia todas as convenções, todas as regras, e todos os pensamentos comuns sobre as doações…
Na verdade, Buffett tinha tomado uma atitude muito sábia, e esse talvez tenha sido seu ato de maior inteligência, pois ele sabia que o dinheiro vertido para as fundações poderia ajudar a melhorar a vida de milhões de pessoas no mundo inteiro. Também nessa última década Buffett passou a defender uma maior tributação sobre a renda dos mais ricos, argumentando que o sistema de arrecadação de impostos era injusto com a base da pirâmide, que pagava mais impostos, proporcionalmente, do que os mais ricos. Enquanto essa resenha da biografia estava sendo escrita, esse esforço empreendido por ele estava sendo chamado de uma tentativa para criar um “Imposto Buffett”.
A escolha da fundação de Bill Gates, para administrar sua fortuna doada, não tinha sido feita de forma descuidada, pois ele conhecia profundamente o trabalho do ex-CEO da Microsoft, tanto é assim que cultivavam uma relação de amizade que perdurava desde o início dos anos 90. Eles se entendiam muito bem, gostavam de trocar ideias, faziam viagens de férias juntos com suas respectivas famílias, enfim, eram grandes parceiros. Os donos das duas maiores fortunas do mundo eram vistos constantemente juntos dando palestras, jogando bridge e participando de eventos. Aliás, vale dizer que o ato de Buffett de liderar uma campanha em prol de mais doações para a filantropia, entre magnatas, é o que faz Warren Buffett ser “o” cara…, como escrevemos outrora.
Atualidades
A inteligência privilegiada de Buffett continuava a funcionar a pleno vapor nos anos 2000, apesar de ele ter diminuído o ritmo de suas atividades à frente da Berkshire. Em 2003, por exemplo, ele escreveu um artigo para a revista Fortune afirmando que tinha feito significativos investimentos em moedas estrangeiras porque acreditava que o dólar estava perdendo valor. E adivinha qual era uma das moedas estrangeiras que ele estava comprando? Siiiimmmm….o real. O lucro de 100 milhões dólares com a compra de reais o ajudou a se manter na ponta como homem mais rico do mundo em 2008.
Em 2004, durante a reunião anual de acionistas da Berkshire, Buffett alertou para os perigos do endividamento das famílias americanas:
“Os Estados Unidos eram como uma família que gasta mais do que ganha. Os americanos estavam comprando imensas quantidades de produtos de outros países e não tinham renda suficiente para pagá-los, porque não estavam vendendo na mesma proporção. Para compensar a diferença, pegavam dinheiro emprestado. E aqueles que emprestavam agora talvez não estivessem tão dispostos assim a fazê-lo no futuro” (p. 817).
Finalmente, sobre a crise do subprime, em 2007, que eclodiu a mais avassaladora destruição de valor na Bolsa de Nova York desde o crash de 1929, Warren afirmou, com sabedoria que lhe é peculiar:
“A economia está definitivamente mudando de direção. Não é meu jogo, mas se precisasse apostar em um lado ou outro… todo mundo sempre diz que uma recessão será curta e superficial. Eu diria que será longa e profunda” (p. 846).
E não é que o Oráculo de Omaha mais uma vez provou estar com a verdade!?
Podemos imitar Warren Buffett?
É a pergunta inevitável que surge ao final da leitura de uma excepcional biografia como esta. Sendo o investidor que mais foi assunto de livros de investimentos do que qualquer outra pessoa, todos tentam imitá-lo. Prova disso é a quantidade enorme de livros sobre seus métodos de investimentos, e a quantidade absurdamente pequena de livros sobre um estilo de investimento mais defensivo, baseado em alocação de ativos e fundos de índice. Mas é o próprio Buffett quem dá a resposta, já no final da obra:
“Não. Ações são coisas boas para se ter ao longo do tempo. A produtividade aumenta e as ações também se valorizam. Há apenas algumas poucas coisas que podem ser feitas de errado. Uma é comprar e vender na hora errada. Pagar comissões altas demais é outra forma de ser trucidado. A melhor maneira de evitar tudo isso é comprar um fundo de índice de baixo custo e, com o passar do tempo, comprar mais. Seja ganancioso quando os outros estiverem amedrontados e amedrontado quando os outros estiverem gananciosos, mas não pense que você pode ser mais esperto que o mercado. Se uma amostragem da indústria americana promete um bom desempenho com o passar do tempo, então por que tentar escolher belezinhas arriscadas e achar que você pode se dar melhor assim? Poucas pessoas conseguem ser investidores ativos” (p. 848, destaquei).
Palavras do maior investidor de todos os tempos, dirigidas a você, cidadão comum que também quer investir em ações.
No próximo artigo dessa resenha em forma de série de artigos, iremos explorar as oito lições que podem ser extraídas a partir da leitura dessa mega-biografia. Não percam!
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
é isso aí…PIBB na cabeca!
Bom artigo. O quote final fechou com chave de ouro.
Muito bom! Sensacional resenha. Estou acompanhando!
Parabéns!
Gui, como dizem na gíria futebolística, adaptando o provérbio, é PIBBa na gorduchinha……rsrsrs
MJC, valeu!
Luciano, obrigado!
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!