“Pelé já era o melhor muito antes de ser e continua sendo mesmo depois de ter sido.”
– Armando Nogueira
Semana passada o mundo se deparou com a morte do maior atleta de todos os tempos, que não era americano ou europeu, mas sim um brasileiro, certamente o mais conhecido do resto do mundo: Pelé.
Não deixa de ser interessante que, ao menos no campo dos esportes, o maior de todos seja alguém do Brasil.
Mais do que isso.
Como disse a manchete de capa da Folha de S. Paulo no dia seguinte ao seu falecimento, trata-se do nome de pessoa de quatro letras mais conhecimento mundialmente.
Muito tem se falado e tem se escrito sobre Pelé nos últimos dias, e o texto de hoje foi pensado e escrito sob uma perspectiva diferente, isto é, sob o ângulo que conecta o que Pelé construiu em sua atividade principal – jogar futebol – com os valores reais que podemos apreender de sua atividade principal como atleta de futebol, executada de uma maneira impecável, e, para dizer a verdade, de uma maneira extraordinariamente superior a de qualquer outro ser humano.
“O difícil, o extraordinário, não é fazer mil gols, como Pelé. É fazer um gol como Pelé”
– Carlos Drummond de Andrade.
O fato é que, no esporte mais popular do planeta, Pelé construiu sua jornada de uma forma tão brilhante que, como bem assinala Paulo Vinícius Coelho, ele, para todos os efeitos, virou a unidade de referência nos esportes.
Quando se compara quem foi o melhor do mundo de todos os tempos no futebol, a comparação não é entre Di Stefano e Maradona; entre Cruijff e Messi; entre Beckenbauer e Cristiano Ronaldo.
A unidade de referência é sempre – e sempre será – Pelé. Será Pelé com Maradona; Pelé com Messi; Pelé com Beckembauer.
Mas a unidade de referência extrapola o campo restrito do futebol (que seria “a coisa mais importante dentre as menos importantes”, como já dizia Arrigo Sacchi), para alcançar todos os demais esportes, de modo que a palavra “Pelé” já virou parâmetro para qualificar os melhores de todos os demais esportes.
Assim, diz-se que, por exemplo, Michael Jordan é o “Pelé” do basquete, e não o contrário; que Tiger Woods é o “Pelé” do golfe, e não o contrário; e assim sucessivamente.
Pelé conquistou recordes impressionantes no esporte mais popular do planeta – que não não poucos – como fruto do exercício e do domínio completo de todos os fundamentos do jogo, como chutes fortes com ambas as pernas, velocidade, arrancadas, gols de cabeça, gols de falta, gols de pênalti, dribles, assistências e visão de jogo. Muito se fala sobre os gols de Pelé – claro, já que é o principal fundamento do futebol – mas pouco se comenta sobre o fato de que ele também era completo como assistente, a ponto de ser o maior assistente na celebrada Copa de 70.
Como diz a Wikipedia:
“O estilo de jogo único de Pelé combinava velocidade, criatividade e habilidade técnica com força física, resistência e capacidade atlética. Sua excelente técnica, equilíbrio, talento, agilidade e habilidades de drible permitiram que ele vencesse adversários com a bola, e frequentemente o via usando mudanças súbitas de direção e fintas elaboradas para passar por jogadores, como seu movimento de marca registrada, o “drible da vaca“
Tudo isso não foi conquistado como obra do acaso, mas sim fruto do exercício diário de virtudes e talentos.
Como o próprio Pelé explicou numa entrevista em 2016, ao ser perguntado sobre como conseguiu levar uma vida saudável ao longo de toda a sua vida (cuja piora só ocorreu a partir de 2012):
“Como eu comecei a jogar futebol muito cedo, com 16 anos eu já estava no Santos e na seleção com 17, talvez isso tenha facilitado a minha alimentação e a minha saúde. Eu acho que o grande fator foi esse“.
E logo em seguida arrematou:
“A parte do esporte me ensinou a comer bem. Eu ainda tive a felicidade de nunca ter esses pequenos vícios, como bebida e cigarro”.
Os treinamentos físicos também sempre fizeram parte de sua rotina, inclusive depois dos 70 anos, como afirmou na mesma entrevista:
“Claro, eu continuo treinando”.
Esses são fatores que passam despercebido pela maioria das pessoas, independentemente de praticar ou não esportes profissionais: os cuidados com a alimentação começaram muito cedo.
Quantos jovens você não conhece, de 16 anos até os 20 e poucos anos, que já estão estragando sua vida com fast food, comidas industrializadas de baixo valor nutritivo, cigarros e principalmente bebidas?
E quantas pessoas, mesmo as que praticam atividades esportivas na faixa dos 20 aos 40 anos, desistem da atividade física depois de uma certa idade?
Talvez um dos pontos mais interessantes dessa entrevista foi o realce que o Pelé, nas suas próprias palavras, deu sobre a relevância do sono para seu desempenho atlético:
“Todas as vezes que o Santos excursionava, os caras ficavam todos cansados, não dormiam direito… e eu dormia“.
Sabemos que o sono desempenha papel essencial em atividades esportivas (além de na vida em maneira geral), e até o maior atleta de todos os tempos deixou isso bem claro em suas próprias palavras.
Porém, como costumava dizer Jim Rohn, a prática de uma disciplina afeta todas as demais disciplinas, e as rotinas saudáveis estabelecidas por Pelé em relação à alimentação, ao sono e à abstinência de bebidas e cigarro (cigarro esse que era muito forte no período em que ele atuou profissionalmente, entre o final dos ano 50 e meados dos anos 70), também se aplicava, obviamente, aos treinos físicos, onde aprimorava suas habilidades, desenvolvidas já desde a infância e a adolescência, que lhe permitiram ter uma carreira singular, a maior e melhor de todos os tempos.
Conclusão
E o que fica de lição para nós, desse gigantesco legado de Pelé (que, como ser humano que foi, cometeu também falhas e erros, como no não reconhecimento da paternidade de sua filha Sandra Regina)?
A função do atleta esportivo é inspirar.
Não obstante o fato de os esportes profissionais de uma maneira geral – e o futebol, em particular – terem se tornado mais um negócio financeiro de entretenimento do que qualquer outra coisa, os atletas têm o papel de inspirar as pessoas.
Nesse contexto, a função das metáforas exerce um papel decisivo, especificamente a metáfora que liga mérito a trabalho, resultado à causa, colheita à plantação.
Claro que Pelé, no campo dos esportes, levo as metáforas ao lado mais extremo de seu significado, assim como Einstein fez em relação às ciências, Mozart fez em relação às músicas ou Van Gogh fez em relação às artes visuais.
Mas justamente pela grandiosidade da obra de Pelé – a ponto de virar medida de referência em qualidade – é que podemos nos dar ao luxo de trazer essa lição para o campo da vida pessoal.
E a lição é precisa essa: a de que podemos, dentro de nosso contexto e da nossa posição no círculo social no qual nos encontramos inseridos, de sermos também, através de nossas atitudes, através de nosso trabalho, através de nossos comportamentos, através de nosso dia a dia, referência positiva para alguém.
Começamos 2023 com esse espírito: seja você também referência, régua, unidade de valor, parâmetro, para alguém. Construa esse ser que habita dentro de você. Empenhe-se em ser o melhor, não em relação aos outros (pode até ser), mas principalmente em ser melhor do que você foi ontem.
Feliz 2023!
Boa analise!!!
Pele deixou um legado e tanto.
E essa indicação de sermos referência na realidade em que vivemos é um estímulo para adotarmos valores melhoras em nossa trajetória
De fato, Marcos!
Baita legado!