Em 1997, acompanhei com muito entusiasmo, dia após dia, rodada após rodada, as notícias pela Internet discada, os jogos pela TV Manchete, a inesquecível campanha de Gustavo Kuerten rumo ao seu desconcertante título em Roland Garros.
Aquele título foi realmente desconcertante porque ele não era favorito, não era cabeça de chave, não vinha de grandes resultados anteriormente, aliás, a bem de verdade, ele nunca tinha ganhado qualquer título do circuito profissional antes, mas, mesmo contra todas as previsões e apostas dos outros, não sabendo que era impossível, foi lá e fez.
Semana passada o tênis, esse esporte fabuloso que, assim como todos os demais esportes, inspira e ensina, forneceu outra preciosa lição de vida, com uma jogadora num nível ainda mais impressionante do que o do Guga antes de Roland Garros.
Emma Raducanu era uma ilustre desconhecida que, até 3 meses atrás, ocupava a surreal posição 338 do ranking mundial.
Teve que jogar o qualificatório para entrar na chave principal, e entrou.
E assim foi construindo sua escalada rumo ao topo, de vitória em vitória, acreditando apenas em si, com foco total em cada partida, em uma ponto de cada vez, bloqueando a sua mente de qualquer coisa que não fosse o próprio jogo, como ela mesmo disse (fonte).
O resultado final, contra uma também surpreendente tenista de ranking baixo, fora dos holofotes, mas que havia vencido partidas contra grandes jogadoras – Leyla Fernandez – foi mais do que merecido, com o título de campeã, numa campanha memorável em que não cedeu sets a ninguém.
Leyla Fernandez, à esquerda; Emma Raducanu, à direita. Duas adolescentes que ensinam gerações de todas as idades: se você trabalhar em silêncio, fizer o extraordinário, e não desistir, resultados muito além de suas melhores expectativas irão ocorrer.
Mas aí você deve estar se perguntando: que lição então poderíamos tirar da espetacular campanha da Emma?
…………….
Assim como eu disse por ocasião desse post, Sobre contos de fadas, Rayssa Leal, diversão e Olimpíadas, o esporte é capaz de fornecer inúmeras metáforas que nos ajudam a compreender os desafios de nosso próprio cotidiano, marcado igualmente por um sem número de desafios, dificuldades e pressões de toda ordem.
Ao jogar contra toda a “lógica do sistema”, Raducanu nos oferece preciosos insights acerca da importância de, se conservarmos e acreditarmos em nosso poder pessoal, empregando-o para um propósito específico, cercando-nos de pessoas favoráveis, com entusiasmo, alegria e determinação, tendo o controle total sobre a qualidade de nossos pensamentos, somos capazes de ir além do que todo mundo pensa.
Dito isso de outro modo: em um ambiente com regras bem definidas, onde todos os participantes possuem o mesmo conjunto potencial de habilidades técnicas, se você estiver dentro do jogo, competindo contra pares que dispõe das mesmas ferramentas, você pode se sair vencedor, ainda que as probabilidades iniciais estejam contra você.
Para conquistar essas vitórias, faça como a Emma fez: jogue um jogo de cada vez. Concentre-se sempre no próximo ponto a disputar. Não ligue para o que outros vão dizer acerca de você.
Melhor ainda: desligue-se disso tudo. Vai lá e simplesmente faça o que deve ser feito, empregando tudo o que de melhor você tiver dentro de si. Duvido que tudo isso dê errado, pois, para pessoas que trabalham arduamente e com inteligência para conquistar algo de valor em suas vidas, o resultado positivo não é opcional, mas um desfecho compulsório.
Em sua realidade pessoal, observe. Seja dentro de uma rodada de entrevistas para um emprego, seja num cenário em que você deve buscar novos clientes para sobreviver, seja ainda simplesmente diante de um campo de trabalho novo, muitos – ou talvez mesmo a maioria – podem duvidar de você, te considerar um simples desconhecido etc. Mas é justamente das sombras do desconhecido é que surgem as grandes inovações, os grandes empreendimentos, as grandes descobertas. Trabalhe em silêncio, não conte para ninguém o que você está fazendo, simplesmente aja, e esteja preparado para quando a oportunidade surgir.
Raducanu era, até 3 meses atrás, uma ilustre desconhecida. Se alguém dissesse, naquela época, que ela se tornaria campeã de um Grand Slam já agora em setembro, 99,99% das pessoas não acreditariam. Mas o que ela fez? Baixou a cabeça?
Não.
Acreditou que, com treinamento diário, dedicação, disciplina e foco, muito foco mental, era possível conseguir grandes feitos. Ela fez o que ninguém fez melhor do que ela nesse Grand Slam, e por isso obteve o que ninguém, exceto ela, obteve: trabalhou dia após dia na ampliação de seus poderes táticos de tênis, de suas habilidades nos fundamentos do esporte; e, nos jogos, foi superando cada etapa, sempre evoluindo a cada ponto, a cada set, a cada jogo. Quanto mais habilidade você adquire, melhor você se torna para aquilo em que está se desenvolvendo. É batata. Não tem erro.
Por isso, não acredite em pessoas que falam que, em razão de suas circunstâncias, você não tem como melhorar.
Balela.
O que você precisa não é mudar as circunstâncias, o que você precisa é mudar a si mesmo.
A partir do momento em que você muda a si mesmo, você muda tudo o que acontece à sua volta – a começar provavelmente pelo seu local onde vive, local onde trabalha e local onde se relaciona com as pessoas. Tudo muda – e para melhor.
A mudança, portanto, não acontece de fora para dentro, mas sim de dentro para fora. Igual Emma fez: ela mudou a si mesmo para conquistar um título tão expressivo. Melhorou seus fundamentos, melhorou seu emocional, melhorou suas habilidades. Ao aperfeiçoar-se, ela ampliou seu poder pessoal, e, ao ampliar seu poder pessoal, ela se tornou campeã. Ela foi muito mais além do que a maioria pensava ou acreditava simplesmente porque ela continuou “talhando” a si mesma, dia após dia. O sucesso não vem por acaso. Ele é fruto de muito esforço, determinação, foco, vontade.
E sabe de uma coisa? Essas qualidades estão ao alcance de qualquer um… mas são poucos os que realmente estão dispostos a abraçar a dor da disciplina, a fim de colher os frutos proveitosos dela. Preferem a dor da procrastinação.
Conclusão
Não estabeleça limites imaginários às suas possibilidades de ação. Tais limites são apenas… imaginários.
O esforço pessoal, o seu esforço pessoal, na realização de qualquer objetivo que seja, pode produzir resultados incomparavelmente surpreendentes aos olhos de todo o mundo.
Por isso, faça como a Emma Raducanu: simplesmente aja. Pois não há limites ao poder da ação. Nem limites ao poder da imaginação. 😉
Guilherme,
Penso como você: trabalhar em silêncio é muito importante.
Precisamos ter cautela sobre o que e para quem falar, pois o que não faltam são pessoas para nos desanimar, para dizer que não vai dar certo. Pessoas que veem apenas dificuldades onde pode haver também boas oportunidades.
Excelente post. Muito bom para o início da semana.
Excelente observação, Rosana.
Trabalhar em silêncio é realmente um dos aspectos mais importantes que qualquer pessoa deve desenvolver. A arte de ficar quieto e de não sucumbir às tentações de divulgar o que se está fazendo.
Inclusive, trabalhar em silêncio, ter metas secretas, é um dos temas de posts que pretendo desenvolver no futuro.
Boa semana também!
Excelente post! Gostaria muito de ler o que tem a dizer a respeito de “trabalhar em silêncio e ter metas secretas”. Abraços.
Obrigado, Paula!
Vou sim produzir e publicar esse post.
Abraços!
“não sabendo que era impossível, foi lá e fez”
Gosto muito dessa frase. A bem da verdade, na enorme maioria dos casos o que ocorre é um “não sabendo que era impossível, foi lá, tentou fazer e não deu certo”. Entretanto há casos em que “o impossível era só questão de opinião”.
Dessas histórias a que mais me deixta impressionado até hoje é a de George Dantzig (*), que chegou atrasado na aula, anotou dois exercícios do quadro e, dias depois, entregou os exercícios com atraso pro professor. Não eram exercícios, e sim problemas em aberto na estatística.
O que acho muito bacana dessas histórias é a questão dessas pessoas excepcionais pensarem fora da caixa. E, para pensarem fora da caixa, elas primeiro tem que saber exatamente como são todos os detalhes da caixa. Um matemático, usando todas as ferramentas atuais (a caixa), prova ou descobre algo novo (fora da caixa). E isso acaba sendo muito diferente do que o pessoal prega por aí, que deve-se sair da caixa de qualquer forma, mesmo que a pessoa não entenda nem a caixa antes…
Indo pro exemplo do tênis, ninguém ganha um Grand Slam jogando ping pong. Tem que ser no tênis, dominando primeiro as jogadas manjadas, treinando bastante e evoluindo. E aí sim, depois de um tempo pode ser que consiga jogadas “fora da caixa”: alguma bola colocada que ninguém pega, por exemplo.
(*) https://web.fe.up.pt/~mac/ensino/docs/OR/otherDocs/PLSimplex_Dantzig_ALendaDoProblemaInsoluvel.pdf
Excelentes comentários, MJC!
Principalmente essa questão de, para pensar fora da caixa, é preciso primeiro saber e dominar as regras de como pensar dentro da caixa.
Muito inspiradora a história do Dantzig, a qual eu não conhecia.
Abraços!