Jonathan Clements é um dos mais conceituados jornalistas norte-americanos especializados na área de finanças pessoais e investimentos.
Com mais de 3 décadas acumuladas de experiência no mercado financeiro, boa parte delas vivida no Wall Street Journal, onde tinha uma coluna sobre finanças pessoais, e atualmente já nos mid-50’s, as ideias e pensamentos dele, que podem ser lidas no ótimo blog Humble Dollar, fornecem muito material para boas reflexões sobre como estruturar princípios duradouros para ter uma vida financeiramente equilibrada.
Eu já havia resenhado um livro dele no remoto ano de 2010 (post aqui), e recentemente fiz referência a um livro lançado há pouco tempo (post aqui).
Contudo, hoje me debruçarei sobre um outro texto, cujo conteúdo me causou uma identificação imediata, e cujas lições podem perfeitamente ser aplicadas também em sua vida financeira.
Trata-se do artigo Looking Bad, em que Clements reflete sobre um arrependimento primordial que ele teve, ao olhar, em retrospectiva, sua bem-sucedida carreira de 3 décadas no mundo dos investimentos.
E qual seria o maior arrependimento dele nos investimentos?
Não se trata de uma escolha equivocada de ações individuais, já que ele preferiu investir em fundos de índice (ETFs).
Não se trata de um balanceamento mal feito entre ações e renda fixa, já que ele, quando jovem, priorizou o investimento em ações, e depois foi lentamente modificando a carteira para investimentos maiores em renda fixa.
Não se trata ainda de uma eventual alocação global errada de investimentos, embora ele reconheça que poderia ter investido menos em ações estrangeiras – mas essa é uma coisa que a gente só vai saber mesmo olhando em retrospectiva.
O maior arrependimento dele, na verdade, não está exatamente nos investimentos propriamente ditos. E ele explica:
“If my big regret isn’t the investments I bought, what is it? More than anything, I wish I hadn’t spent so much time watching the markets”.
Trocando em miúdos, nas palavras de Jonahtan, seu maior arrependimento com investimentos é ter gasto tanto tempo acompanhando os mercados.
E achei esse arrependimento travestido de “conselho aos mais jovens” simplesmente fantástico, pois ele é inteiramente aplicável para muitos investidores brasileiros, principalmente os investidores iniciantes.
E a dica aqui é exatamente essa: não gaste mais tempo do que o estritamente necessário analisando e monitorando seus investimentos.
Eu sei que a euforia é grande, é enorme, é difícil de conter, quando começamos a investir em ações. Gastamos horas e mais horas em análises gráficas, em análises fundamentalistas, acompanhando diariamente os mercados., tentando prever o movimento futuro das ações.
Gastamos incontáveis horas no home broker, incontáveis horas monitorando as notícias que podem impactar as ações da Ambev ou da Cielo, gastamos incontáveis e preciosas horas vendo se hoje eu ganhei ou eu perdi. A troco de quê?
Meu começo no mercado de ações deve ser parecido com o de muitos leitores do blog que começaram a investir na Bolsa entre 2006 e 2008: acompanhávamos eufóricos as IPOs que surgiam movidas a festa e estardalhaço, ficávamos grudados nas notícias do canal Bloomberg Brasil, monitorávamos minuto a minuto o sobe e desce das ações na tela do home broker da Ágora, da Ativa, da LinkTrade… a troco de quê exatamente?
Sim, eu sei que se trata de uma fase, de um período de aprendizado, e que todo investidor que se preze passa necessariamente por essa fase de euforia, agitação e emoções… mas, como Jonathan diz no artigo dele, você não precisa ficar monitorando tanto o mercado – a não ser que isso constitua seu principal meio de vida.
A conclusão é que eu não terei esse arrependimento de Jonathan, por saber, principalmente por experiência própria, que acompanhar diuturnamente, no curto e no curtíssimo prazos, os mercados, não me agregará valor a longo prazo.
Por quê acompanhar diariamente as ações é tão atrativo?
Jonathan enumera 3 razões principais, que fazem com que boa parte dos investidores fique tão grudado nas cotações diárias das ações.
Primeiro, porque é difícil ignorar o que se passa com os mercados, dada a facilidade dos meios de comunicação. Hoje, podemos saber as cotações olhando até mesmo no relógio. Podemos igualmente disparar ordens de compra e venda dentro de um carro, indo ou voltando do trabalho. Podemos abrir contas em corretoras sem nunca ter pisado os pés na sede dela.
Porém, isso é um perigo, pois, como ele adverte:
“We receive far too much short-term feedback on our long-term investments, and with that comes the risk that we will act hastily”.
É isso mesmo. Recebemos muito feedback a curto prazo sobre nossos investimentos de longo prazo, e com isso vem o risco de agirmos apressadamente.
O segundo motivo tem um cunho emocional: ver os altos e baixos do mercado não deixa de ser uma forma de entretenimento, ainda que um tanto quanto insensato.
Assim como ficamos alegres quando nosso time favorito de futebol ganha, e ficamos triste quando ele perde, isso também ocorre com as ações: ficamos alegres quando termina o dia e as ações da Vale subiram 3%, mas ficamos tristes se essas mesmas ações despencaram 4%.
Terceiro, e mais importante de todos: monitorar diariamente os mercados nos oferece a ilusão do controle. Jonathan explica:
“If the stock market plunges, I feel it’s important that I know right away—even though my awareness won’t stem the market’s losses and, indeed, I won’t do much with the information”.
No final, ele conclui que, diante dessa constatação, está tentando se controlar para não acompanhar tanto os mercados, uma vez que os números que chamam a atenção dele não terão significado algum amanhã, quando tais números serão substituídos por outros que logo serão insignificantes na semana seguinte…
Preste sua atenção naquilo que interfere em sua atenção
O texto de Jonathan nos oferece insights preciosos que vão além da irrelevância de olhar para os preços das ações todos os dias.
É mais do que isso: é sobre como utilizar com sabedoria os preciosos recursos de tempo e de atenção de que dispomos atualmente.
Pense por um momento: que diferença vai fazer, para seu patrimônio daqui a 30 anos, se hoje a Bolsa subir 0,92%, ou cair 1,45%? Nenhuma, não é mesmo? Se é assim que as coisas ocorrem, então pra quê gastar energia com coisas que não merecem sua energia?
Mesmo no caso do fatídico dia em que a Bolsa caiu quase 10%, aquilo lá, olhando sob um enquadramento a longo prazo, também é insignificante. Mais importante do que o sobe e desce diário das ações é verificar se você fez aportes regulares, consistentes e disciplinados ao longo de 30 anos de investimentos. Isso sim é que irá fazer a diferença na sua vida. 😉
Eu mesmo já passei dessa fase de ficar acompanhando diariamente os preços das ações. O único momento do mês em que eu de fato sei e faço o registro o sobe-desce do mercado de ações é por ocasião do fechamento do mês – que, por coincidência, é hoje. 😉
No restante do mês, eu evito ficar olhando o sobe-e-desce da Bolsa de Valores. Fico dias, às vezes semanas, sem saber o que está ocorrendo no mercado de ações, porque saber ou não saber não irá mudar minha vida.
Repito: não irá mudar a minha vida. Eu não me importo com coisas que não importam. Eu pratico a ignorância seletiva de informações. Esse tipo de alimento mental é junk food. Não presta.
É mais ou menos o que ocorre com os imóveis: você fica perguntando todo dia ao corretor se o preço do seu imóvel subiu ou desceu? Não, né!? Então por quê essa ansiedade toda em relação aos preços das ações, ouro, dólar, fundos imobiliários e quaisquer outros ativos com cotação diária?
Mas no começo não foi assim. No começo do meu investimento direto em ações, há exatos 10 anos, todo dia eu dava uma passada na página da corretora e acessava a minha conta, pra saber se eu tinha ganhado ou perdido, se minhas ações tinham se valorizado ou não. Todo dia.
Todo dia. 🙁
Com o passar do tempo, com mais educação financeira, mais conhecimento, e mais clareza sobre minhas prioridades do uso do tempo, e consequentes prioridades dos meus recursos de atenção e energia psíquica, eu fui abandonando esse péssimo hábito, de modo que hoje minha monitoração dos mercados financeiros fica restrita, basicamente, ao final do mês. E só.
O que eu perdi com esse abandono progressivo do monitoramento dos mercados? Nada. O que eu ganhei? Incontáveis horas de tempo, e incontáveis recursos de energia psíquica, mental e emocional, os quais passaram a ser canalizados, alocados e direcionados para atividades realmente produtivas e que fizessem diferença efetiva, concreta e tangível em minhas ações diárias. 🙂
Conclusão
Gaste seu tempo com coisas que façam valer o seu tempo.
Se você passa muito tempo olhando o home broker, e investe na Bolsa com objetivos de longo prazo, procure reavaliar o consumo de tempo com esse tipo de atividade, à luz de uma estratégia baseada em investimentos igualmente a longo prazo.
Como acertadamente disse Clements no artigo acima referido,
Recebemos muito feedback a curto prazo sobre nossos investimentos de longo prazo, e com isso vem o risco de agirmos apressadamente.
Cuidado com isso. Excesso de informação, excesso de barulho, pode não ser conveniente.
Evite esse risco desnecessário. Como eu já disse anteriormente aqui no blog, num texto mais antigo ainda, publicado em 2009, seu tempo é um recurso mais valioso que o dinheiro.
Atualmente, há vários estudos científicos, apoiados por evidências empíricas como a relatada no artigo de Clements, que revelam que uma vida saudável passa necessariamente pelo uso inteligente do tempo que temos à nossa disposição.
Canalize-o para atividades produtivas e que proporcionem utilidade e crescimento em sua vida pessoal e profissional, e, com isso, você auferirá vantagens que dinheiro nenhum te proporcionará. Ainda dá tempo. 😉
Mais um excelente artigo.
“Recebemos muito feedback a curto prazo sobre nossos investimentos de longo prazo, e com isso vem o risco de agirmos apressadamente.” Eu acho que é exatamente por isso que muitos sabem exatamente a fórmula mágica dos investimentos e não aplicam, porque não dão tempo ao tempo.
A famosa frase “Em bolsa, o negócio é comprar ao som dos canhões e vender ao som dos violinos” também raramente é aplicada na prática. O medo e o excesso de informação atrapalha e muito. As pessoas acham que quanto mais se informarem melhores ficarão. Mas realmente existe excesso de informações, exemplo telejornais que só falam de crime podem facilmente ser dispensados, enquanto algumas pessoas acham crucial se informar de tudo, pois é importante saber o que está acontecendo. Aí te cito novamente: “Eu pratico a ignorância seletiva de informações.” Se a informação vai gerar medo (e isso vale para investimentos) é melhor nem ficar sabendo.
Oi Douglas, excelente comentário, como sempre.
Concordo particularmente com sua última frase:
“Se a informação vai gerar medo (e isso vale para investimentos) é melhor nem ficar sabendo.”
Abraços!
Excelente post Guilherme!
De nada adianta acompanhar o mercado agora, sendo que o queremos para depois…
Abraços!
Obrigado, II!
Legal esse post, Guilherme. Estou vivendo isso, esta fase agora…
Comecei a investir em ações em maio deste ano. Todo dia entro para monitorar.
No meu caso, não invisto a longo prazo. Sou especuladora.
Para quem visa o curto prazo, para os especuladores, é importante acompanhar o sobe e desce diário, junto com análise gráfica, para poder entrar no suporte (ou próximo a ele) e vender na resistência (ou próximo a ela).
Esse tempo que passo monitorando tenho aprendido bastante. Não considero tempo perdido e sim, tempo de muito aprendizado.
Entro com um objetivo, depois que alcanço, desligo o monitor ou entro no fim do dia, pois muitas vezes em que ganho um dinheirinho é comprando no fim e vendendo no dia seguinte, na abertura do mercado.
Agora, para a pessoa que investe a longo prazo, realmente é perda de tempo entrar todo dia para monitorar…
Procuro reinvestir o que ganho na bolsa. Ter muita paciência é outro grande segredo. Nem sempre a ação alcança determinado preço no dia que você imaginou. Enfim… estou gostando bastante do mercado acionário! Ampliei meus investimentos e percebo que o mercado acionário é algo encantador! Abraços, amigo.
Oi Isabela!
Muito legal que você tenha começado a investir em ações! Com conhecimento e experiência prática acumuladas, você vai refinando suas técnicas e aprimorando suas habilidades com esse tipo de investimentos.
Abraços, e sucesso!
Jonathan Clements is a very wise gentleman indeed!
Na mesma categoria que Jack Bogle. Eu li cada artigo que ele publicou no WSJ desde 2000. Agora, atraves do blog dele, http://www.humbledollar.com. Excelente a sua interpretaçao e disseminaçao dos ensinamentos dele aqui no Brasil Guilherme onde sao igualmente relevantes!!
Olá Marcos!
Muito legal saber que você acompanha o trabalho do JC há quase duas décadas!
E obrigado pelas palavras!
Boa reflexão.
É realmente tentador ficar olhando variações de investimentos voláteis, mais ainda quando acompanhado por alguma notícia “bombástica”. Como investidor tento atuar de forma passiva investindo em fundos de índices (ETF).
Olá xará, obrigado! Legal que vc também adotou o passive investing na Bolsa.
Abraços!
Estava precisando desse texto! Parabéns!
Obrigado, Júlio!
Grande VR.
Legal de mais o post.
Diz-se que o sábio aprende com os erros dos outros. E esse é um ótimo exemplo de quem passou por uma situação que se arrependeu, e não gostaria que outras pessoas passassem pelo mesmo.
Abraço
Diário de Finanças Online
Valeu, DFO!
Realmente, nada melhor do que aprender com as experiências (e os erros) dos outros.
Abraços!
Grande relato e grandes experiências! Aprender com os erros é o melhor acerto!
Obrigado, IO!
Que artigo enorme, mas valeu a leitura. Estava pesquisando sobre o assunto a por sorte acabei caindo aqui.
Obg por compartilhar Guilhemer.