Há alguns anos, li um artigo muito interessante da Danuza Leão, que comentava a respeito da perda da capacidade de sonhar das crianças que crescem conhecendo o mundo todo, sem tê-lo conhecido antes em livros, histórias, fotografias…
Nesse artigo, Danuza situava a questão dentro do contexto então existente: marcado pelo dólar baixo, real forte e aumento do poder de renda e de crédito endividamento, muitos casais estavam levando seus filhos pequenos para o exterior. Pode até ser interessante e tal, segundo a autora, mas que graça tem para um menino que aos 5 anos já conhece o Havaí, aos 7, já visitou Nova York, aos 9 foi para Paris e aos 11 já rodou metade da Ásia?
Será que eles vão aproveitar as viagens da mesma forma que alguém aproveitaria se tivesse antes sonhado em fazê-las? Danuza questiona:
“Tem alguma coisa melhor do que realizar um sonho sonhado durante muito tempo?”
E ela mesma responde:
“Cada um fala por si, claro; quando criança, eu sonhava com Paris, e nunca pensei que fosse lá algum dia. Mas sonhei tanto, que um dia fui, e minha emoção e minhas recordações estão dentro de mim até hoje, intactas. Eu conhecia Paris antes de conhecê-la, e cada rua, cada museu, cada café me remeteu aos sonhos que povoaram minha adolescência.”
Eu quero ampliar essas reflexões, tão bem elaboradas pela Danuza, para o contexto da educação financeira: que graça tem receber a riqueza pronta, num ato de sorte na Mega-Sena, ao invés de construi-la diuturnamente, na base da raça (como diria o Julian e a Naê), da disciplina, do esforço, do trabalho duro e do planejamento? Coisas que vêm muito fáceis vão também embora muito rapidamente, e nós precisamos cultivar dentro de nós a chama acesa de sonhos não realizados, e batalhar para transformá-los em realidade. Só assim poderemos dar o devido valor às nossas conquistas, que serão melhor saboreadas e, sem dúvida, mais valorizadas também.
Danuza continua:
“O triste é que essas crianças que crescem conhecendo o mundo todo perdem a capacidade de desejar, de sonhar. Estou cansada de ver uma garotada sem vontade de nada, pois já tiveram tudo, desde cedo; entendem de sushi, conhecem as grifes, possuem todos os iPads e iPods do mundo e não conseguem se deslumbrar com mais nada”.
Será que parte de nós também não está com essa “síndrome do deslumbramento” que tem acometido cada vez mais crianças, por conta do crédito fácil, quero dizer, endividamento fácil? Hoje, você não precisa ter R$ 100 mil em cash para comprar aquele carrão importado: se você estiver disposto a se endividar até o talo, assumir prestações de 72 meses, poderá tê-lo na garagem amanhã. Mas será que vale a pena esse tipo de deslumbramento, feito, em boa parte dos casos, só para impressionar os outros?
Hoje, você não precisa ter R$ 400 mil no banco para comprar o imóvel dos seus sonhos: o banco “camarada” está com uma linha de crédit, quero dizer, de dívidas, já pré-aprovada para você pegar esse luxuoso apartamento, em questão de dias. Mas… vem cá, será que você precisa disso mesmo? Aquilo que todo mundo fala corresponde e está alinhado com suas necessidades atuais e reais de consumo?
Hoje, é extremamente fácil comprar um iPhone ou um iPad – a um clique de mouse, com frete grátis e prestações que chegam a 18 parcelas. Mas pera lá… não dá para segurar um pouquinho só esse desejo de consumo (se for realmente uma necessidade, ou mesmo um ímpeto, não importa), guardar dinheiro, fazer um sacrifício e esperar os preços baixarem um pouco?
Você daria tanto valor ao seu cargo/emprego/profissão atual se ele viesse de “mão beijada”? Você dará tanto valor à carreira para a qual você está se preparando, e que você pretende conquistar em breve, se ela antes não tiver habitado o mundo de seus sonhos?
Para conferir à vida um sentido mais profundo, e para tornar as conquistas ainda mais saborosas, você precisa manter viva a capacidade de sonhar. Antes de conhecer seu objeto de desejo no mundo real, você precisa conhecê-lo no mundo de seus sonhos. Você precisa dormir com ele, pensar nele nas horas vagas, traças planos com ele…
Se você tiver crianças em casa, esse é um bom momento para refletir sobre o valor dos sonhos como ferramenta para a consecução de objetivos e o crescimento pessoal de seus pimpolhos, sejam eles – os sonhos – quais forem: uma viagem, um passeio, um brinquedo, um presente…
Pois, no final das contas, eu concordo integralmente com a Danuza: não tem nada melhor do que realizar um sonho sonhado durante muito tempo. 🙂
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!
Olá, colega! Tudo bem contigo?
Deixe-me apresentar um contraponto à ideia do seu texto.
Uma vez um amigo meu, que hoje é um grande e bem sucedido advogado, disse para mim que admirava as pessoas que davam valor por alguma coisa, quando esse algo tinha vindo de maneira fácil. Dar valor quando se tem que esforçar muito é bem fácil, difícil é dar valor quando se recebe algo sem muito esforço.
Para mim essa é a grande cegueira da humanidade. Você, por exemplo, se esforçou muito para não ser escravo de alguém? Teve que lutar muito para ter liberdade de expressão? Precisou de muito treinamento e estudo para viver num país sem grandes crises étnicas e religiosas? Alguém fez esforço por viver num mundo ainda com uma grande diversidade biológica?
A nossa incapacidade de apreciar tudo que nos foi legado de forma gratuita por outras gerações e pela natureza em si é que talvez seja uma das grandes causas de desequilíbrio principalmente em nossas sociedades ocidentais.
Ipod, carros, etc, isso tudo é perfumaria perto de questões tão mais relevantes para a nossa vida nesse pequeno ponto azul.
Uma criança brasileira poder viajar pela Ásia é fantástico, assim ela pode crescer com a ideia de que há diversas culturas, diversas formas de ver o mundo, mas que mesmo assim somos todos humanos mesmo que com “roupagens” diversas.
Um grande abraço Guilherme e um ótimo ano novo:)
Excelente contraponto!
Se toda discussão tivéssemos outros pontos de vista desse tipo, o resultado final seria bem interessante.
Concordo com você. Bem interessante este ponto.
Sei que o texto fala sobre sonhos e valorização, mas olhando de outro lado ainda, é uma pena que o tempo do consumismo e crédito fácil esteja acabando, mesmo que muitas pessoas ainda não se deram conta. A economia se desenvolve é dessa forma. Grandes fortunas são criadas é dessa forma. Na Europa, com juros de 2% a.a para empréstimos, não há incentivo algum para poupar. O negócio é gastar mesmo, aproveitar a vida, comprar o carro que lhe agradar. Isso não é necessariamente ruim.
É ruim para o brasileiro que pode perder o emprego a qualquer momento por má gestão do país ou que a bolsa cai 41% por instabilidade econômica e politica. Em um país estável acredito que aproveita-se mais a vida, sem ter que guardar dinheiro sempre para tempos de vacas magras.
Tenho amigos na Europa e fico abismado de como a noção financeira deles é completamente diferente. É gente desempregada fazendo viagem pra Ásia, é gente largando emprego pra viajar o mundo por 6 meses, vive de seguro desemprego e vai em restaurantes todo dia, recusa oportunidade de treinamento gratuita, etc. A certeza da estabilidade é muito grande, a certeza de que não vai passar fome ou não poder pagar as contas é muito grande. Não precisa dessa paranoia de guardar cada centavo como eu faço ou de valorizar cada conquista como se a vida fosse em volta disso.
A vida é mais que isso. A vida é além do dinheiro. Eu vejo o Brasil como o Japão, não tem emprego ou renda, você é um nada, sente vontade de se suicidar. Não deveria ser assim, as coisas deveriam ser mais fáceis. E olha que eu não tenho absolutamente nada do que reclamar, mas sinto sempre a incerteza do futuro.
Olá Soulsurfer, ótimo contraponto, como disseram o MJC e o Douglas!
De uma maneira geral, existe uma dificuldade do ser humano de valorizar as coisas que vêm de modo fácil, e, como regra, só damos valor a algo quando o perdemos. Vide o caso da saúde: as pessoas em geral só passam a valorizar a saúde depois que acontece alguma doença grave, por exemplo.
Abraços!
Olá, Guilherme. Gostaria primeiramente de te parabenizar pelo blog. Apesar de não ter o hábito de comentar, acompanho semanalmente suas postagens.
A notícias de hoje não é muito boa. para quem aplica em LCA no BB, o rendimento das novas aplicações caiu para 81%:
Liberação p/ resgate: 27/03/2016
Rendimento bruto: 81,00% do CDI
Vencimento: 12/12/2018
Hora de mudar o foco, principalmente com as previsões de tributação deste investimento.
Olá OSSO, obrigado pela informação.
Realmente, o BB está de fato desestimulando seus clientes a investirem na LCA.
Lamentável…
Abraços!
Excelente comentário do amigo soulsurfer. Pegando um gancho, entro na questão de viver com simplicidade, independente de quanto patrimonio a pessoa conquistar.
Viver com simplicidade é dar valor a tudo que você possui, inclusive dar valor para aquelas coisas que são tão faceis para você obter.
Dar valor também a sua familia e amigos, que são mais importantes do que qualquer bem material que você venha a possuir, independente de quão caro ele custe.
Infelizmente as pessoas hoje em dia tem dado mais valor ao materialismo, tornando tudo muito dispensável, inclusive a capacidade de sonhar, traçar metas e objetivos para a própria vida e carreira. O imediatismo frustra a longo prazo.
Muitas pessoas conquistam um emprego e dois anos depois acham que aquilo é pouco para elas e que elas são melhores que aquilo. Conheço vários exemplos disso. Pessoas que jogam tudo para o ar em função de não conseguirem criar um plano para o médio e longo prazo.
A falta de capacidade de sonhar tem um custo muito elevado para o futuro, pois pode deixar a pessoa sem rumo
Douglas,
Gostei do seu comentário e também do soulsurfer.
Viver com simplicidade amplia nossa visão em relação ao que realmente é importante.
E no final, sempre percebemos que mais importantes que as coisas são os momentos vividos com intensidade, aqueles momentos nos quais nos sentimos vivos completamente.
O marketing, a mídia e a sociedade em geral nos pressionam de alguma forma a manter um certo status.
Como está escrito em Romanos 12, não deveríamos nos amoldar aos padrões do mundo. Acredito que deveríamos ser mais coerentes com nossos valores e princípios, o que geralmente passa muito longe do consumo.
No final, isso é que fará realmente diferença em nossa vida.
Gostaria de compartilhar aqui alguns posts do meu blog sobre o assunto:
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2014/01/a-morte-e-um-dia-que-vale-pena-viver.html
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2015/04/um-instante-de-vida-que-poderia-durar.html
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2013/11/alegoria-da-existencia.html
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2013/10/koyaanisqatsi-vida-fora-de-equilibrio.html
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2015/05/modernidade-superficial-e-descartavel.html
http://simplicidadeeharmonia.blogspot.com.br/2015/05/obsolescencia-programada-voce-sabe-o.html
Que 2016 seja um ano bom para todos nós.
Ótimos comentários, Douglas e Rosana!
O mundo de hoje está assolado pelo materialismo, egocentrismo, e busca de padrões de consumo ditados pelo marketing e pela mídia.
Viver com simplicidade é como remar contra a maré. Difícil, mas não impossível.
Abraços!
Guilherme,
Os resultados da simplicidade são tão significativos que, para quem tem afinidade com o tema, vale a pena remar contra a maré.
Abraços,
Certamente, Rosana! 😀
Abraços!
Acho que devemos aprender a valorizar tudo aquilo com o que nos deparamos. Sejam coisas ou situações que por algum motivo nos encontraram ou mesmo aquilo que pelo nosso próprio esforço conquistamos.
Pois, na verdade, esses são os alicerces sobre o quais nos apoiamos e vivemos nossas vidas, cada um do seu jeito. O que mais deve ter valor é ser feliz ao longo do caminho, enquanto estivermos nele.
Ótimas palavras, Rogério!
Além do que já foi comentado, precisamos considerar também o princípio da individualidade e o tempo de maturidade de cada um para ter consciência do que realmente devemos valorizar.
PS.: LCA BB a 81,25% do CDI para aplicações abaixo de R$ 500 mil.
Sem dúvida, Vagner!