Um dos canais que mais assisto é a Globo News. Nos últimos dias, ela estava passando, nos intervalos de programação, chamadas para dois programas especiais sobre os 80 anos de Clint Eastwood, um dos grandes ícones de Hollywood e até do cinema mundial. Daí eu pensei: “bem, se estamos em 2010, e o cara tá fazendo 80 anos esse ano, então ele nasceu em 1930. Caramba, mas tem outra pessoa famosa que nasceu em 1930 e esse ano estará completando 80 anos. É o Warren Buffett!”.
Lendo a biografia dele, lendo alguns dos últimos artigos sobre os negócios em que está envolvido, e refletindo sobre isso tudo, me veio a pergunta: por quê ele não se aposenta? Afinal, o cara é um dos mais ricos do mundo, tem tempo, tem dinheiro, tem energia… está com a vida feita (na verdade, mais do que feita…rs).
Certamente existem várias razões pelas quais ele não pendurou o paletó, e eu vou me concentrar em duas que considero essenciais.
Em primeiro lugar, W. Buffett não se aposenta porque ele ama o que faz. Ele tem paixão pelo processo de investir, que é, afinal de contas, sua especialidade. O seu trabalho é desenvolvido com paixão. Ele vive sua paixão. Daí a primeira conclusão: quem tem paixão pelo que faz nunca – ou dificilmente – irá querer se aposentar. A revista Isto É Dinheiro publicou recentemente uma matéria com homens de negócios que alcançaram o auge de seus empreendimentos depois dos 80 anos. Isso é que é vontade de trabalhar! Aliás, eu até suponho existir uma correlação negativa entre desejo de se aposentar e trabalho atual: quanto mais a pessoa deseja se aposentar, menos ela gosta do trabalho atual. O inverso também é verdadeiro: quanto mais ela gosta de sua ocupação, menos desejará se aposentar.
Mas isso não explica tudo.
Veja o caso, pegado aleatoriamente, de Gustavo Kuerten, o melhor tenista brasileiro que até hoje surgiu, tricampeão em Roland Garros e dono de um grande carisma junto aos fãs. Ele – tal qual Buffett – amava o que fazia, que era jogar tênis. Mas então por quê parou? Simples: porque existia uma limitação física à sua atividade. Quem é esportista sabe que tem uma vida útil limitada no esporte. W. Buffett não se aposenta porque sua ocupação principal depende, basicamente, do uso da mente, e com o cérebro ocorre uma coisa curiosa: quanto mais é exercitado, melhor é utilizado. E, com o passar do tempo, embora se saiba que ocorram degenerações nos tecidos cerebrais, de um modo geral, quanto mais o cérebro é utilizado, mesmo com o decorrer do tempo, a pessoa consegue ficar saudável por mais tempo. Uma postura cerebral ativa é condição essencial para prolongar uma vida com mais qualidade. É por isso que se recomenda a prática de palavras cruzadas, aprendizado de um idioma novo, e muita leitura para os mais idosos: são práticas que conduzem a uma velhice mais saudável e proativa. Oscar Niemeyer já passou dos 100 faz algum tempo e continua a pleno vapor.:D
Há alguns dias atrás, eu estava no avião e ao meu lado estava uma senhora de impressionantes 84 anos de vida e de uma lucidez absolutamente fantástica. Era formada em Direito, tinha lecionado francês durante 47 anos, havia estudado na Sorbonne (uma das universidades mais renomadas e de maior prestígio no planeta), e agora estava fazendo passeios, visitando parentes e viagens para reencontrar amigos de faculdade. E fazendo palavras cruzadas no avião.
A segunda conclusão: W. Buffett não se aposenta porque tem ainda energia para fazer aquilo que gosta. Esportistas vão perdendo a energia com o passar do tempo. Quem tem um trabalho predominantemente intelectual, como Buffett, parece que vão ganhando energia com o passar do tempo. Tanto é que Buffett fez o maior negócio de sua vida, a compra de uma ferrovia, no ano passado. Aos 79 anos de idade! E devo dizer que ele também fez um grande negócio, aos 78 anos, ao recusar investir seu dinheiro num tal de… Lehman Brothers, conhece? 😀 (até parece que queriam “passar a perna” no oráculo de Omaha, se deram mal….hehe).
Em suma, identifique suas habilidades, identifique suas paixões, e invista seu tempo, seu dinheiro e sua energia naquilo que gosta de fazer. Desse modo, você perceberá que não é o destino (aposentadoria) que importa, mas sim a jornada. 😀
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus lhes abençoe!
Caro Hotmar:
Durante muito tempo, compartilhei desse princípio que V. apresenta em seu texto sobre o Warren Buffett e suas razões para não se aposentar. Porém, recentemente, uma conhecida fez-me mudar de ideia parcialmente, razão pela qual lhe escrevo estas linhas. Ou seja, a questão maior é aposentar-se duma determinada função ou parar de trabalhar definitivamente, sem exercer nenhuma outra qualquer?
Essa minha conhecida, pessoa ainda na flor da idade, com doutorado em Biologia na Inglaterra, decidiu não mais trabalhar… com pesquisa em Biologia. Quando eu soube disso, perguntei-lhe se ela não gostava do que fazia, e por que chegou tão longe para descobrir isso, sempre baseado naquele princípio de que quem desenvolve uma atividade intelectual não precisa nem de força física para trabalhar, haja vista aquele cientista famoso, Stephen Hawking, que sofre uma doença degenerativa, que dá conferências numa cadeira de rodas e continua a escrever livros, com enorme sucesso de público.
Ela respondeu-me, então, que gostava muitíssimo do que fazia e que, a princípio, pensava que não havia vida além da Biologia. Mas, com o tempo, mudou de ideia. Ela percebeu, não sei se sozinha ou com a ajuda dalgum guru, que o seu ciclo vital com a Biologia havia terminado, que era o momento de ir buscar outra atividade (não sei se seria aquela história de passear num parque, de manhã; abrir uma lojinha de artesanato, à tarde). Então, essa senhora, que considero muito sábia, disse-me que a dignidade não está (somente) em trabalhar tantas horas por dia, durante tantas décadas. É preciso saber ouvir essa voz interior, para, no momento mais adequado, mudar de rumo, sem ter a sensação de perda.
Aparentemente, foi isso que a moveu a abrir a tal lojinha de cerâmica marajoara, da qual ela está muito orgulhosa e insiste que era aquilo que deveria ser feito. Ademais, a nossa amiga, dantes, bióloga notável, seguia trabalhando, com a firmeza de que, mais para adiante, quer ter o privilégio de mudar novamente de ideia e dedicar-se a outra coisa completamente diferente.
saudações,
puigllum
É preciso saber ouvir essa voz interior, para, no momento mais adequado, mudar de rumo, sem ter a sensação de perda.
Boa colocação, gostei!
O problema maior é essa sensação de perda.
Muitas vezes insistimos em prolongar etapas, e no final isso trará muito sofrimento e decepção pois ao prolongar uma deixamos de viver a etapa que era a adequada para o momento.
Exato, Rosana. Daí a importância de estar bem dos pontos-de-vista emocional e espiritual para fazer a transição com a tranquilidade de que foi tomada a decisão mais acertada!
Abç!
puigllum, seus muito pertinentes seus comentários sobre essa nova perspectiva de vida trazida a partir de uma experiência concreta de uma pessoa real, que mudou para melhor seu estilo de vida.
Essa busca interior com objetivo de alinhar suas atividades diárias aos seus valores é um dos grandes desafios que temos hoje. Preencher o sentido da vida é o elemento central que guia as pessoas em busca do melhor. E parabéns para a nossa notável bióloga, ela conseguiu dar mais valor à sua voz interior do que a voz de outros.
E parabéns pelo comentário tb: é o de nº 400 do blog! 😀
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus lhes abençoe!
Não havia lido este seu artigo Guilherme,
Destaco a frase “quem tem paixão pelo que faz nunca – ou dificilmente – irá querer se aposentar”
Assino em baixo.
Abraço!
Há anos que leio blogs, mas nunca tinha apreciado um post tão excepcional como este. Realmente nos faz parar e pensar. Sucesso!
Jônatas, obrigado!
Rocha, grato pelas palavras!
É isso aí!
Um grande abraço, e que Deus os abençoe!